segunda-feira, 23 de julho de 2012

É ilusão oportunidade sem empreendedorismo



A OIT - Organização Internacional do Trabalho adotou, em 1944, a Declaração de Filadélfia como parte integrante de sua Constituição, reconhecendo que "todos os seres humanos, independentemente de raça, credo ou sexo, têm o direito de buscar seu bem-estar material e seu desenvolvimento espiritual em condições de liberdade e dignidade, de segurança e de igual oportunidade". Esta Declaração serve de base para a formatação de políticas públicas e a projeção de metas de desenvolvimento social em inúmeros países, inclusive no Brasil.

Mas, será possível existir oportunidade sem empreendedorismo? Ora, oportunidade é definida no Houaiss como “ocasião favorável para a realização de algo”, ou seja, um ensejo para se empreender uma realização. Ainda, este mesmo dicionário nos diz que empreendedorismo é “disposição ou capacidade de idealizar, coordenar e realizar projetos, serviços, negócios”.

Empreendedorismo é, na verdade, a arte de realizar sonhos. A partir disso, não há limites para quem é persistente e possui os conhecimentos necessários. Assim, empreendedorismo se torna uma capacitação possível a qualquer pessoa que se disponha a ter as atitudes e os comportamentos necessários para “fazer acontecer” oportunidades.

O sucesso em qualquer campo de atuação humana é, em ultima instância, fruto da sua ação empreendedora e da luta cotidiana focada em atingir objetivos. Em geral, são empreendedores todos aqueles capazes de trabalhar hoje sem perder o olhar no futuro.

Transcrevemos a partir do livro “O poder da atitude”, de Alexandre Slivinik, esse exemplo bastante emblemático da história de um dos políticos mais famosos do mundo: “ele montou um negócio em 1831, mas não deu certo. Foi derrotado na candidatura a vereador em 1832. Fracassou em outro negócio em 1834. A noiva faleceu em 1835. Teve um ataque de nervos em 1836. Foi derrotado em outra eleição em 1838. Foi derrotado para o Congresso em 1846. Foi derrotado para o Congresso em 1948. Foi derrotado para o Senado em 1855. Foi derrotado para a vice-presidência em 1856. Foi derrotado para o Senado em 1858. Foi eleito Presidente da República dos Estados Unidos em 1860. Seu nome? Abraham Lincoln. Um dos mais notáveis estadistas da humanidade”.

Com efeito, a persistência é característica obrigatória nos homens e mulheres de sucesso. Steve Jobs foi expulso de sua própria empresa, a Apple, após lançar o Macintosh. Por cinco anos desenvolveu tecnologias para a produção de filmes animados por computador em sua nova empresa, a bem sucedida Pixar, e retornou à Apple para salvá-la da insolvência, com sucesso. Albert Einstein também foi expulso da escola, porque não tinha capacidade para aprender, mas a história comprovou a genialidade dele. Nelson Mandela, após passar 27 anos na prisão, se elegeu presidente da África do Sul e se consagrou como o maior líder da África Negra, tendo sido agraciado com o Premio Nobel da Paz.

Exemplos como esses nos fazem ver o valor do empreendedorismo como instrumento de superação de adversidades. Dele, aprendemos que sempre que vislumbramos metas a alcançar nos fortalecemos no enfrentamento dos inúmeros obstáculos cotidianos. Assim, mitigamos o impacto que essas adversidades nos impõem e somos mais criativos nas soluções delas. Porém, quantos potenciais Lincoln, Einstein, Jobs e Mandela se perderam nos ideais deles pela falta de capacidade empreendedora? Talvez já tivéssemos a cura do câncer, a fórmula da paz mundial, a equação que resolveria a exclusão social e a degradação ambiental. Quem sabe essas soluções chegaram a alguma cabeça que recuou no primeiro obstáculo?

Não há como falar em igual oportunidade, princípio fundamental das modernas políticas sociais, de forma dissociada da educação empreendedora – o aprender a fazer – que deve estar presente em todos os níveis da escola regular, assim nos diz a UNESCO. Isso, porque até a sorte é definida como o encontro da oportunidade com a competência de empreender. O resto é ilusão!



      Publicado no jornal Cinform em 23/07/2012 – Caderno Emprego
  

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Estranhas terceirizações




     O Brasil permite um universo muito restrito de possibilidades legais para a terceirização nas empresas privadas e no serviço público. O nosso desvario de regras faz do país um recordista em reclamações trabalhistas: são cerca de 2 milhões de processos por ano, que comparado aos  75 mil dos Estados Unidos, revela um panorama infernal sobre o tema.


     Certamente, o excesso de regulamentação normativa gera desencontros nos próprios códigos, alimentando, assim, as chances de conflitos. Além disso, a superproteção ao trabalhador brasileiro é incoerente com o perfil demográfico atual. Já é razoável flexibilizar a relação trabalhista entre profissionais de nível superior e as empresas privadas, especialmente as micro e pequenas que representam um imenso e frágil universo superior a 99% do total.

     Também será bom para o País admitir terceirizados em áreas fins, se menores de 26 anos e pelo prazo máximo de dois anos nas empresas públicas, como forma de ampliar o acesso ao primeiro emprego por meio de uma experiência realmente qualificada. Isso consolidará a formação desses aspirantes, que poderiam candidatar-se ao processo seletivo público com mais bagagem e certeza da própria vocação, evitando o tão comum desvio de função no serviço público.

     Por certo, Getúlio Vargas, por mais visionário que fosse, jamais teria condições de enxergar a complexidade do mundo de hoje, ao criar a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT. Ao longo dos mais de 60 anos de emendas na referida lei, o Brasil conseguiu o impropério de punir os que mais empregam.

     Mas, conforme o título deste artigo, vamos falar sobre estranhas terceirizações. Michael Sandel, professor da Universidade de Harvard e autor do livro “Justiça – o que é fazer a coisa certa”, nos aponta dois exemplos intrigantes: na Guerra Civil Americana, em 1862, a obrigatoriedade do serviço militar atingia a tradição liberal em sua base, que levou a União a abrir uma ampla concessão: quem fosse convocado e não quisesse servir poderia contratar outra pessoa para assumir seu lugar. Desta forma, tanto os combatentes do Norte como os do Sul podiam ser contratados por preços de até US$ 1.500, valor considerável na época.

     Como alternativa, a União estipulou que o convocado que não quisesse servir poderia ser dispensado mediante o pagamento de uma taxa de US$ 300, que correspondia a um ano de salário de um trabalhador não qualificado. O resultado é que dos 207 mil efetivamente alistados, 87 mil pagaram a taxa de compensação, 74 mil contrataram substitutos e apenas 46 mil de fato serviram. Este conflito ficou conhecido como “guerras dos ricos, luta dos pobres”.

     Bem mais recente é este segundo caso: desde que se tornou possível a fertilização humana “in vitro”, isto é, a fecundação de um óvulo e um espermatozoide fora do corpo humano, surgiu um novo mercado de barrigas de aluguel. Esse tipo de fertilização extracorpórea pacificou questões judiciais anteriores sobre a verdadeira maternidade da criança, uma vez que, antes, essa reprodução se dava a partir do conjunto óvulo + útero da gestante, vinculando automaticamente a mãe biológica ao feto.

     Essa tecnologia fez brotar um mercado considerável de mulheres dispostas a abrigar, no ventre delas, o desenvolvimento do ovo importado, serviço que realizado nos Estados Unidos custava até US$ 80 mil, entre despesas médicas e a “locação da barriga”. Na cidade de Ananda, no oeste da Índia, em 2008, mais de 50 mulheres tiveram filhos para casais estrangeiros. O custo total, nesse caso, fica em torno de US$ 25 mil, isto é, um terço do americano. A mulher indiana recebe em nove meses US$ 7.500, o equivalente a 15 anos de salário médio da região.

     Esses são dois casos extremos de terceirização, ambos legais e polêmicos. Desse modo, nem vamos tão longe, mas manter o que temos hoje – até que a morte os separe -, para os contratos de trabalho é ver neles a mesma missão do que no casamento civil, em que, também creio, ocorrem estranhas terceirizações.


      Publicado no jornal Cinform em 09/07/2012 – Caderno Emprego