segunda-feira, 19 de março de 2012

Finlândia, educação e coisas do coração


A Finlândia, país nórdico, com pouco mais de 5 milhões de habitantes é o exemplo mais bem sucedido de educação regular, conforme comprovam resultados comparativos do exame internacional pisa, aplicado em um grupo de cerca de 65 países para avaliar o desempenho dos alunos em Ciências, Matemática e Linguagem. Nesse mesmo teste, o Brasil tem ficado sempre entre as piores notas, ao lado de nações africanas e de países como, Cazaquistão, Panamá, Peru e outras.
     Hoje, a Finlândia colhe os frutos de um trabalho iniciado ainda na década de 1970, quando efetuou amplas reformas na educação e perpetuou esse processo ao longo de 30 anos. Aliás, só é possível consolidar um projeto em educação, se houver visão em longo prazo e um pacto social que assegure continuidade de ações. Nos últimos 40 anos, a Finlândia passou de país eminentemente agrário e industrial para uma moderna economia do conhecimento. Lá está a sede da Nokia, maior fabricante de celulares do mundo.
Mas qual a fórmula para esse sucesso? Há alguns meses, esteve no Brasil o Professor Doutor Pasi Sahlberg, especialista em educação, ex-assessor do Ministério da Educação da Finlândia, que proferiu uma palestra apresentando os quatro paradoxos da educação de seu país.

     Primeiro paradoxo: “Less is more” (menos é mais) – Educação de qualidade não significa grandes volumes de aulas, tarefas e exercícios. Isso, na visão do Dr. Sahlberg, pode provocar exaustão e queda de rendimento dos alunos. Conhecimento não é sinônimo de educação.

     Segundo paradoxo: “More learning with less testing” (aprende-se mais com menos avaliações) – O tempo gasto com avaliações é deslocado para ações educativas mais proveitosas e menos estressantes, inclusive para o professor. As avaliações devem ter caráter mediador, isto é, não classificatório. Não devem servir para rotular um aluno, mas sim para orientar as ações do professor na superação das deficiências de ensino-aprendizagem.

     Terceiro paradoxo: “Equity through diversity” (igualdade na diversidade) – A chegada de inúmeros imigrantes para o país enriquece a educação e o desenvolvimento de hábitos de convivência respeitosa e trocas de experiências.

     Quarto paradoxo: “The better a high school graduate is, the more likely she wants to become a teacher” (Quanto melhor é uma estudante ao finalizar o Ensino Médio, maior o desejo desta de se tornar professora) – De acordo com dados daquele país, cerca de 25% dos formandos do ensino médio querem ser professores. A profissão é valorizada financeira e socialmente. Os professores são reconhecidos pela sociedade como muito importantes para o futuro da nação, ficando em segundo lugar entre todas as profissões, perdendo apenas para os policiais. Assim, os melhores alunos podem ser os melhores professores.

     Lá, diferentemente da maioria dos países avaliados, apenas metade das crianças até seis anos está na escola, já que a pré-escola é voluntária. E, muito acertadamente, a alfabetização só inicia aos sete anos de idade com a frequência escolar obrigatória até os 16 anos. Saliente-se que o professor é o principal pilar desse modelo educacional invejável, sendo valorizado e preparado para a função. Todos possuem mestrado.

     Devemos refletir sobre as mudanças que realizamos na sofrida educação brasileira, se é que de fato elas possuem algum mérito qualitativo. Antecipar a alfabetização, aumentar a carga horária, ampliar a quantidade de dias letivos, estimular a competição do Enem ou vestibular e outras podem ser a contramão da verdadeira educação. Será falta de paixão?

     Curiosamente, a Finlândia tem uma história de amor com a educação que remonta ao século 17. Naquela época, o arcebispo luterano Johannes Gezelius determinou que nenhum homem que não soubesse ler poderia se casar. Sua motivação era fazer avançar a reforma de Martinho Lutero, que propunha uma aproximação maior dos fiéis com Deus a partir da leitura pessoal da Bíblia. Assim, a paixão que movia um finlandês por uma dama, também o levava à escola para aprender a ler.



Publicado no jornal Cinform em 19/03/2012 – Caderno Emprego


segunda-feira, 5 de março de 2012

América Latina: um discurso memorável



     Durante a Cúpula das Américas de 2009 em Trinidad e Tobago, ocorreu, como se esperava, um permanente confronto ideológico entre alguns dirigentes latinoamericanos e Barack Obama, representante máximo do emblemático Estados Unidos. Contudo, próximo do final, o Presidente da Costa Rica e Prêmio Nobel da Paz, Óscar Arias, discursa convidando a todos para uma reflexão sobre a quem devemos responsabilizar pelo fracasso latinoamericano.     


     A seguir, alguns trechos do seu pronunciamento: “Tenho a impressão de que cada vez que os países caribenhos e latinoamericanos se reúnem com o presidente dos Estados Unidos da América é para pedir-lhe coisas ou para reclamar coisas. Quase sempre, é para culpar os Estados Unidos de nossos males passados, presentes e futuros. Não creio que isso seja de todo justo”.


     Veja mais: “Não podemos esquecer que a América Latina teve universidades antes que os Estados Unidos criassem Harvard e William & Mary, que são as primeiras universidades desse país.  Não podemos esquecer que nesse continente, como no mundo inteiro, pelo menos até 1750 todos os americanos eram mais ou menos iguais: todos eram pobres. Ao aparecer a Revolução Industrial na Inglaterra, outros países sobem nesse vagão: Alemanha, França, Estados Unidos, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e aqui a Revolução Industrial passou pela América Latina como um cometa, e não nos demos conta. Certamente perdemos a oportunidade.


     Há 50 anos, o México era mais rico que Portugal. Em 1950, um país como o Brasil tinha uma renda per capita mais elevada que o da Coreia do Sul. Há 60 anos, Honduras tinha mais riqueza per capita que Cingapura, e hoje Cingapura, em questão de 35 a 40 anos, tornou-se um país com $40.000 de renda anual por habitante. Bem, algo nós fizemos mal, os latinoamericanos.


     Que fizemos de errado? Nem posso enumerar todas as coisas que fizemos mal. Para começar, temos uma escolaridade de 7 anos. Essa é a escolaridade média da América Latina. e não é o caso da maioria dos países asiáticos. Certamente não é o caso de países como Estados Unidos e Canadá, com a melhor educação do mundo, similar a dos europeus. De cada 10 estudantes que ingressam no nível secundário na América Latina, em alguns países, só um termina esse nível secundário.


     Como disse esta manhã, não pode ser que a América Latina gaste $50.000 milhões em armas e soldados. Eu me pergunto: quem é o nosso inimigo? Nosso inimigo, presidente Correa, desta desigualdade que o Sr. aponta com muita razão, é a falta de educação; é o analfabetismo; é que não gastamos na saúde de nosso povo; que não criamos a infraestrutura necessária, os caminhos, as estradas, os portos, os aeroportos; que não estamos dedicando os recursos necessários para deter a degradação do meio ambiente; é a desigualdade que temos que nos envergonhar realmente; é produto, entre muitas outras coisas, certamente, de que não estamos educando nossos filhos e nossas filhas. 


     Vá alguém a uma universidade latinoamericana e parece, no entanto que estamos nos anos sessenta, setenta ou oitenta. Parece que nos esquecemos de que em 9 de novembro de 1989 aconteceu algo de muito importante, ao cair o Muro de Berlim, e que o mundo mudou. Temos que aceitar que este é um mundo diferente, e nisso, francamente, penso que os acadêmicos, que toda gente pensante, que todos os economistas, que todos os historiadores, quase concordam que o século XXI é um século dos asiáticos não dos latinoamericanos. E eu, lamentavelmente, concordo com eles. Porque enquanto nós continuamos discutindo ideologias, continuamos discutindo sobre todos os "ismos" (qual é o melhor? Capitalismo, socialismo, comunismo, liberalismo, neoliberalismo, socialcristianismo...) os asiáticos encontraram um "ismo" muito realista para o século XXI e o final do século XX, que é o pragmatismo”.






Publicado no jornal Cinform em 05/03/2012 – Caderno Emprego