segunda-feira, 28 de março de 2011

Somos todos transformadores



     O título deste texto é o mote da Semana da Inclusão Digital 2011, promovida pelo CDI – Comitê para Democratização da Informática que transcorrerá no período de 27 de março a 2 de abril. É acertada a iniciativa de promover o acesso de todos às modernas TICs - tecnologias da informação e comunicação, assunto que essa ONG desenvolve há muitos anos. Nascido no Brasil, o CDI é reconhecido internacionalmente por atuar em vários países do mundo, assim como o seu jovem e notório fundador: o carioca Rodrigo Baggio.


Muitos dos avanços tecnológicos são sistêmicos, isto é, estruturantes das organizações sociais, pois agem modificando hábitos e valores culturais e diferenciando grupos e indivíduos. Dessa forma, tornaram-se capazes de gerar demandas totalmente inimagináveis há alguns poucos anos atrás. Exemplo disso é o telefone celular que mudou comportamentos, chegando a níveis de domínio capazes de  alterar a psique de indivíduos quando privados do acesso a este aparelho, em parte pela falta de segurança pública no país ou mesmo  pela possibilidade de conexão destes com as viciantes redes sociais da internet.


Essa componente social é uma faceta excludente da tecnologia. Leva à formação de ‘tribos’ que se distanciam das maiorias. Um jovem sem acesso a internet em nossos dias é alguém, indubitavelmente, excluído dos demais. Essa exclusão não deriva de modismo, mas da crua realidade de ocupar um mesmo território geográfico, uma mesma contemporaneidade e ter a certeza de viver em outro mundo.


Recentemente, soube que tramita no Congresso Nacional uma PEC – Proposta de Emenda à Constituição, que cria a obrigação de o Estado Brasileiro ofertar acesso à internet a todos. Trata-se de um esforço louvável de combate a exclusão digital. Sei também que algumas escolas públicas estão experimentando a distribuição de laptops para todos os alunos, derivado do projeto one laptop per children, desenvolvido por Nicholas Negroponte, diretor do MIT – Instituto de Tecnologias de Massachusetts, nos Estados Unidos. Dessa experiência, já não gosto. À primeira vista, por desconhecer um projeto pedagógico que sustente de forma saudável o uso intensivo de computadores por crianças, além de expô-las à insegurança de portar esses equipamentos.


Desconheço mesmo a necessidade de uma criança usar computador. Não vejo ganho pedagógico no uso dessa ferramenta por elas. Precisam é de brincar, correr, desenhar, sentir a textura do papel, o atrito de um pincel com a tinta, trabalhar manualmente com argila, couro, lã, equilibrar-se numa bicicleta, nadar, jogar bola, experimentar e reconhecer os limites delas e das coisas, vivenciar a existência de outros humanos, praticar artes, ouvir o som de um tambor ou de um piano real, ouvir estórias, soltar a imaginação, aprender conteúdos escolares contextualizados, sentir o cheiro da borracha e da cola escolar, falar, cantar, apreciar a beleza da natureza, etc. Isso sim, dentro de um ambiente pedagógico acolhedor, trará segurança na existência do futuro adulto.


Inclusão digital exige mediação. Não basta oferecer acesso a internet ou a computadores se não houver um trabalho pedagógico associado. A mesma internet que educa também deseduca. Os sites inadequados são mais numerosos e fáceis de encontrar que os apropriados. Desta forma, o computador com seus jogos ou a internet com seus abusos mais prejudicam que auxiliam na educação e na formação social da criança usuária e desassistida. Creio que a pedagogia que comanda o uso dos recursos de TICs nas escolas brasileiras, públicas ou particulares, é orientada bem mais pelos interesses de mercado que os educacionais.


Com efeito, exclusão digital não é assunto que diga respeito apenas aos pobres. Ela é muito mais perversa, atingindo a muitos, inclusive da elite intelectual e econômica. Ter o melhor computador com banda larga e ser excelente usuário de seus programas aplicativos não significa estar incluído. Somos todos vítimas de abusos no uso das TICs quando temos nossa privacidade invadida; nossos dados pessoais sigilosos postos à venda em CDs de camelôs; quando somos rastreados sem autorização ou conhecimento disto; quando somos violados eletronicamente pelo fisco invasor; quando o nosso sigilo eleitoral e votos se tornam crença na inviolabilidade (sic) da urna eletrônica, deixando assim de serem garantias constitucionais; ou quando se modernizam apenas os órgãos da arrecadação pública com super computadores para as finanças ou radares de ultima geração para multarem motoristas imprecisos e se esquecem da modernização do serviço ao público. 
  

Não entendam como um desabafo e sim como um convite à reflexão: para onde vai nosso Brasil? Nós, cidadãos podemos escolher o rumo da construção de uma sociedade melhor. Afinal, somos todos transformadores!





Publicado no jornal Cinform 28/03/2011 – Caderno Emprego

segunda-feira, 14 de março de 2011

Landell de Moura, gênio, empreendedor, inventor e injustiçado



     Pe. Roberto Landell de Moura  -  Serviu a Deus e a Ciência - Precursor da Telefonia e Telegrafia sem fios. Patrono dos Radioamadores do Brasil. 21.01.1861 - 30.06.1928.


     Estes são os dizeres inscritos numa placa de bronze integrante do busto do Padre cientista, que se encontra instalada na sede da LABRE/SP – Liga de Amadores Brasileiros de Rádio Emissão, doada aos colegas brasileiros por radio amadores portugueses, após a eleição em 1981, que consagrou o Padre Landell de Moura como ‘Patrono dos Radioamadores do Brasil’.


     Nasceu em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, em 1861, onde estudou Humanidades. Mudou-se para o Rio de Janeiro, onde foi cursar a Escola Politécnica. Na companhia de seu irmão Guilherme, seguiu para Roma, onde no Colégio Pio Americano e na Universidade Gregoriana estudou teologia, física e química, sendo ordenado Padre em 1886.


     De volta ao Brasil, residiu no Rio de Janeiro, capital do império, onde teve a oportunidade de rezar uma missa para Dom Pedro II e toda sua corte. Esta aproximação com o reino permitiu a ele expor suas idéias sobre transmissão do som e da imagem através de ondas e luz ao imperador, com quem manteve freqüentes diálogos científicos.


     Em 1887 retornou ao Rio Grande do Sul, permanecendo até 1892, quando foi transferido para a cidade paulista de Santos. Daí seguiu para Campinas - SP e após, para a cidade de São Paulo, onde atuou como capelão do Colégio Santana, situado em bairro do mesmo nome. Em Campinas, aprofundou seus estudos sobre a propagação de ondas portadoras de sons e imagens postulando o seguinte: ‘Dai-me um movimento vibratório tão extenso quanto a distância que nos separa dessas outras terras que rolam sobre as nossas cabeças ou sob nossos pés, e eu farei chegar a minha voz até lá’.


     Desta afirmação surgiu a certeza de ser possível criar a tecnologia, revolucionária para a época - de transmitir voz através do ar. Durante a residência no bairro de Santana, em São Paulo, realizou os primeiros experimentos de emissão de voz entre os altos de Santana e a Avenida Paulista, distantes 8 quilômetros em linha reta. Este evento foi testemunhado por diversas autoridades e jornalistas, em 1893. Um ano antes, portanto, do italiano Marconi, ser considerado ‘inventor do rádio’, Landell teve o registro no Brasil do seu “aparelho destinado à transmissão phonética à distância, com fio ou sem fio, através do espaço, da terra e do elemento aquoso”, patente                   nº. 3.279.


     O Jornal "O Estado de São Paulo", de 16 de julho de 1899, anunciava uma das experiências públicas de Landell: " Telephonia Sem Fios: Hoje ás 9 horas da manhan, no Collegio das Irmans de S.José, em Sant´Anna, realisar-se-á uma experiência de telephonia sem fios, com a apparelhos inventados pelo redvmo. padre Landell de Moura. A experiência versará sobre a telephonia aerea e subterranea. O Sr. Padre Landell de Moura, que convidou para este acto de varias autoridades, homens de sciencia e representantes de imprensa, fará uma prelecção antes de proceder nas experiências de seu invento".


    Imediatamente após o registro da patente, não encontrando apoio financeiro e moral para prosseguir com o desenvolvimento de seus aparelhos, o Padre Landell conseguiu autorização da Igreja para viajar para os Estados Unidos a fim de registrar patentes. A esta altura, foi perseguido por fiéis fanáticos que o acusavam de pacto com o diabo e destruíram seu laboratório. Lá, obteve três patentes no The United States PatentOffice, em New York, Estados Unidos: “Transmissor de Ondas” - precursor do rádio, “Telefone sem fio” e “Telégrafo sem fio”. Nas patentes agregou vários avanços técnicos como transmissão por ondas contínuas, por meio da luz, princípio da fibra óptica e por ondas curtas. Também em 1904 o Padre Landell começou a projetar, de forma precursora, a transmissão da imagem, ou seja, de televisão e de textos, teletipo, à distância.


     O jornal New York Herald, 12 de Outubro de 1902, em reportagem sobre os inventos revolucionários do brasileiro, relatou as seguintes palavras do inventor: "No Brasil, uma multidão supersticiosa acusava-me participante com o diabo, interromperam os meus estudos e quebraram os meus aparelhos. (...) Conheci o que é sentir como Galileu para gritar: "Eppur si muove".


     De volta ao Brasil, o Padre foi visto como louco pelas autoridades públicas e eclesiásticas por declarar ingenuamente que seu invento permitiria até a comunicação interplanetária. Assim, com grande desgosto, abandonou sua carreira de inventor, dedicando-se até o fim da vida a atividade sacerdotal.


     Essa foi a saga de um empreendedor brasileiro. Agora somos obrigados a resgatar a glória desse gênio, gravando em nossa história sua titularidade de o “pai do rádio”, igualmente como reverenciamos a Santos Dumont. Para apoiar esta causa entre no site WWW.mlm.landelldemoura.qsl.br e participe do abaixo assinado, já apoiado por várias instituições brasileiras. Faça parte!



Publicado no jornal Cinform 14/03/2011 – Caderno Emprego

terça-feira, 1 de março de 2011

A economia da atitude



     A história ensina que a economia se baseia em pilares de sustentação, em torno dos quais tudo gira. Quando olhamos o mundo moderno, isto é, da revolução industrial para os dias atuais, o que vemos é a passagem por paradigmas econômicos fundamentais. O primeiro desses está vinculado ao fazer, ou seja, às habilidades manufatureiras. Sua lógica determinante é a busca da eficiência e precisão nas fábricas, que consiste em montar com eficiência, ajustar tempos e movimentos humanos às máquinas e linhas de montagem e aumentar a eficiência energética. Enfim, surgem aí o fordismo e a administração científica de Taylor. Essa é a economia da habilidade.


Ficar parado não é condição que se aplique à economia. Logo, vem a partir da segunda guerra mundial, durante a chamada guerra fria, uma nova onda que rapidamente ocupa a maior fatia da economia mundial contemporânea. É a economia do conhecimento. Nesse modelo, os ativos mais valiosos são os produtos intangíveis, aqueles desprovidos de matéria ou extremamente miniaturizados como, por exemplo, softwares, biotecnologia e transgenia, entretenimentos hollywoodianos, patentes, marcas e direitos autorais. Essa economia do conhecimento, no mesmo ritmo veloz em que se expande, também exclui, na medida em que exige escolaridade, empreendedorismo, pesquisa e inovação. Insumos raros para países periféricos, onde capital humano e capital social se mostram escassos e só são alcançados a contento, no prazo de gerações.


Vivemos extasiados pelo pensamento, afinal, só aí somos verdadeiramente livres. Assim, supervalorizamos o discurso bem pronunciado, ainda que vazio, a competição do vestibular, a lógica cartesiana e fria da informática e até a racionalidade e a inteligência de nossas crianças. Paralelamente, esquecemos ou tratamos de forma distante a formação do caráter, as boas maneiras, a convivência harmoniosa e produtiva, o trabalho em grupo, as ações voluntárias de ajuda social, o cuidado com o meio ambiente, o respeito ao próximo e a muitos outros valores da alma humana que precisam ser educados igualmente.


A economia da atitude, título deste artigo, nos remete a uma zona invisível, sobre a qual autores e formadores de opinião não costumam falar, mas, certamente representa uma significativa parcela do PIB. Inúmeros consultores nos apontam que a principal causa de demissão nas empresas é atitude ou comportamento inadequado, chegando a representar mais de oitenta por cento do total das causas apresentadas. Daí, em quanto eleva o custo das empresas a substituição precoce de funcionários? 


Vemos, a todo instante, campanhas públicas para o combate à dengue. Muito da proliferação do mosquito vetor decorre da atitude das pessoas em favorecer a acumulação de água em vasos, garrafas, pneus, etc. Quanto custa a dengue à sociedade? Da mesma forma, detritos, sacos plásticos e diversos entulhos largados à rua são causadores de entupimentos de esgotos e drenos de águas da chuva. Qual o prejuízo social de uma inundação urbana?


Dirigir embriagado ou cometer imprudências ao volante são problemas comportamentais caríssimos aos cofres sociais. Dos acidentes automobilísticos decorrem muitas perdas irreparáveis como mortes e invalidez, além de danos materiais e serviços hospitalares onerosos.


A violência urbana, a corrupção, as drogas, o número de roubos de carros tão grande que somente 3 ou 4 montadoras teriam condição de produzir o suficiente para repor os carros roubados no Brasil, são comportamentos criminosos, decorrentes de falhas de caráter.


O famoso cientista e poeta alemão Goethe afirmava que “é na solidão que se educa o talento e na torrente do mundo o caráter”. Desta sentença concluímos que educar o pensar, sem educar o sentir e o agir produz pessoas potencialmente deformadas. Nossos adolescentes vivem uma grande solidão, trancados em condomínios, transportados para a universidade em condução escolar (sic), mergulhados na internet ou nos games. Estão, assim, perdendo a oportunidade de desenvolver o social, prioridade máxima dessa faixa etária. Apesar de serem extremamente talentosos, muitos, porém, encontram-se inapetentes para o social. Pela falta de embates nos contatos diretos com outros, como estão quanto ao desenvolvimento do caráter?


Sou dos que acreditam na educação e no seu poder de bem formar seres humanos. Desta forma, não vejo possibilidade de crermos em educação sem a participação direta das famílias na escola, nem nas escolas que educam para o vestibular. A educação deve atuar no intelecto, na convivência e na ação, afinal, de tudo que estudamos só ficamos com aquilo que pomos em prática.


Espero ver esta nasciturna economia da atitude em ação ao produzir uma sociedade de paz e reduzir o custo social gerado por atos destrutivos. Concluo que educação é o melhor dos investimentos que se pode fazer em um país. O custo não é educar, é não educar.




Publicado no jornal Cinform 28/02/2011 – Caderno Emprego
Publicado no Jornal do Comércio / SE – Editorial fev/2011

Publicado na revista Tecnologia da Informação & Negócios nº 08/2012
            Publicado na revista Jovem Empreendedor nº 01, maio/2014