O título deste texto é o mote da Semana da Inclusão Digital 2011, promovida pelo CDI – Comitê para Democratização da Informática que transcorrerá no período de 27 de março a 2 de abril. É acertada a iniciativa de promover o acesso de todos às modernas TICs - tecnologias da informação e comunicação, assunto que essa ONG desenvolve há muitos anos. Nascido no Brasil, o CDI é reconhecido internacionalmente por atuar em vários países do mundo, assim como o seu jovem e notório fundador: o carioca Rodrigo Baggio.
Muitos dos
avanços tecnológicos são sistêmicos, isto é, estruturantes das organizações
sociais, pois agem modificando hábitos e valores culturais e diferenciando
grupos e indivíduos. Dessa forma, tornaram-se capazes de gerar demandas
totalmente inimagináveis há alguns poucos anos atrás. Exemplo disso é o
telefone celular que mudou comportamentos, chegando a níveis de domínio capazes
de alterar a psique de indivíduos quando
privados do acesso a este aparelho, em parte pela falta de segurança pública no
país ou mesmo pela possibilidade de
conexão destes com as viciantes redes sociais da internet.
Essa
componente social é uma faceta excludente da tecnologia. Leva à formação de
‘tribos’ que se distanciam das maiorias. Um jovem sem acesso a internet em
nossos dias é alguém, indubitavelmente, excluído dos demais. Essa exclusão não
deriva de modismo, mas da crua realidade de ocupar um mesmo território
geográfico, uma mesma contemporaneidade e ter a certeza de viver em outro
mundo.
Recentemente,
soube que tramita no Congresso Nacional uma PEC – Proposta de Emenda à
Constituição, que cria a obrigação de o Estado Brasileiro ofertar acesso à
internet a todos. Trata-se de um esforço louvável de combate a exclusão
digital. Sei também que algumas escolas públicas estão experimentando a
distribuição de laptops para todos os alunos, derivado do projeto one laptop per children, desenvolvido
por Nicholas Negroponte, diretor do MIT – Instituto de Tecnologias de
Massachusetts, nos Estados Unidos. Dessa experiência, já não gosto. À primeira
vista, por desconhecer um projeto pedagógico que sustente de forma saudável o
uso intensivo de computadores por crianças, além de expô-las à insegurança de portar
esses equipamentos.
Desconheço
mesmo a necessidade de uma criança usar computador. Não vejo ganho pedagógico
no uso dessa ferramenta por elas. Precisam é de brincar, correr, desenhar,
sentir a textura do papel, o atrito de um pincel com a tinta, trabalhar
manualmente com argila, couro, lã, equilibrar-se numa bicicleta, nadar, jogar
bola, experimentar e reconhecer os limites delas e das coisas, vivenciar a
existência de outros humanos, praticar artes, ouvir o som de um tambor ou de um
piano real, ouvir estórias, soltar a imaginação, aprender conteúdos escolares
contextualizados, sentir o cheiro da borracha e da cola escolar, falar, cantar,
apreciar a beleza da natureza, etc. Isso sim, dentro de um ambiente pedagógico
acolhedor, trará segurança na existência do futuro adulto.
Inclusão
digital exige mediação. Não basta oferecer acesso a internet ou a computadores
se não houver um trabalho pedagógico associado. A mesma internet que educa
também deseduca. Os sites inadequados são mais numerosos e fáceis de encontrar
que os apropriados. Desta forma, o computador com seus jogos ou a internet com
seus abusos mais prejudicam que auxiliam na educação e na formação social da
criança usuária e desassistida. Creio que a pedagogia que comanda o uso dos
recursos de TICs nas escolas brasileiras, públicas ou particulares, é orientada
bem mais pelos interesses de mercado que os educacionais.
Com efeito,
exclusão digital não é assunto que diga respeito apenas aos pobres. Ela é muito
mais perversa, atingindo a muitos, inclusive da elite intelectual e econômica.
Ter o melhor computador com banda larga e ser excelente usuário de seus
programas aplicativos não significa estar incluído. Somos todos vítimas de
abusos no uso das TICs quando temos nossa privacidade invadida; nossos dados
pessoais sigilosos postos à venda em CDs de camelôs; quando somos rastreados
sem autorização ou conhecimento disto; quando somos violados eletronicamente
pelo fisco invasor; quando o nosso sigilo eleitoral e votos se tornam crença na
inviolabilidade (sic) da urna eletrônica, deixando assim de serem garantias
constitucionais; ou quando se modernizam apenas os órgãos da arrecadação
pública com super computadores para as finanças ou radares de ultima geração
para multarem motoristas imprecisos e se esquecem da modernização do serviço ao
público.
Não entendam
como um desabafo e sim como um convite à reflexão: para onde vai nosso Brasil?
Nós, cidadãos podemos escolher o rumo da construção de uma sociedade melhor.
Afinal, somos todos transformadores!
Publicado no jornal Cinform
28/03/2011 – Caderno Emprego
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