Diz a lenda que com a chegada dos portugueses em nossas terras tupiniquins, a aproximação pacífica junto aos índios aconteceu sob a oferta de presentes inusitados aos antigos donos da terra. Dentre estas quinquilharias estavam espelhinhos, adereços, colares, adornos, e outros um-e-noventa-e-nove.
Trato esse
assunto como lenda por não acreditar que nossos antepassados, de ambos os
lados, fossem tão ingênuos. Também não sei como é possível um povo invasor,
numericamente insignificante, dominar outro em sua própria selva. Penso que a
única explicação plausível é a formação de alianças militares entre portugueses
e índios para combater outros índios. O combate na floresta é dificílimo. Que o
diga o americano derrotado no Vietnã, a despeito de toda tecnologia de guerra
moderna, ainda ineficaz na selva.
O lance mais
sedutor desse descobrimento brasileiro foi o acesso a tecnologias desconhecidas
pelos anfitriões. O aço dos facões, as embarcações, os tecidos, os animais
domésticos, especialmente as galinhas e cães. Em troca, os nativos forneceram
pau-brasil, matéria-prima para a produção de tintas vermelhas, raras para a
indústria têxtil da época, e animais silvestres. Para nossos índios, esse
encontro significou um salto tecnológico de dezenas de milhares de anos, pois,
aí tiveram contato com a linguagem escrita, a tecnologia do ferro e as naus
transatlânticas, dentre outras tecnologias úteis ao dia a dia, a exemplo dos
anzóis e machadinhas. Imaginemos que ganho isso representou para eles. Em
contrapartida vieram doenças terríveis e vícios pessoais e sociais.
Assim,
começa um longo processo de Brasil colônia. Brasil da exportação de
matéria-prima e da importação de bens tecnológicos que perdura ainda hoje. Um
interessante parâmetro para avaliar nosso desempenho industrial é o preço do
quilo de bens exportados comparado ao preço do quilo dos bens importados. Nessa
comparação veremos que não estamos bem na foto. Grosso modo, um único quilo de
satélite, que importamos, tem o mesmo preço que um milhão de quilos de soja que
exportamos. Assim, afirmam autores de referência.
Então, para
melhorar a qualidade dos produtos brasileiros exportados, além dos necessários
investimentos em pesquisa e desenvolvimento – P&D, pré-requisito para a
inovação e a redução da sufocante e injusta carga tributária, nós temos de
investir maciçamente em formação tecnológica e em educação básica, bem como,
ajustar o câmbio à realidade.
À medida que
mantemos o Real artificialmente forte priorizamos as importações e dificultamos
as exportações. Isso significa sucateamento da indústria nacional e consequente
perda de competitividade. Em outras palavras, criamos um círculo vicioso que
nos afasta cada vez mais do mercado internacional e compromete nosso saldo da
balança comercial. Este saldo incrementa a reserva cambial e nos dá segurança
contra movimentos especulativos e quebradeira econômica, embora seja um
dinheiro caro por ser muito mal remunerado quando comparado aos nossos
estratosféricos juros internos: quatro vezes superior. Há economistas que
afirmam que essa reserva, mal remunerada, nos custa 1% do PIB anualmente.
Devido aos
robustos 300 bilhões de dólares de nossa reserva cambial recentemente
convivemos com a crise financeira internacional que não se fez tão visível
contra nossa economia. Mas, seguramente teve um custo alto para todos nós, na
forma de dívida interna e custo da máquina pública.
A economia
de bens e serviços produzidos pelo país não pode existir na qualidade de refém
da abusiva valorização do Real. A permanência nesses níveis cambiais pode
significar um retrocesso ao desenvolvimento. Isto é, um desastroso retorno ao
Brasil rural do início do século passado, com o agravante de nem sequer
possuirmos um agronegócio verdadeiramente nosso, posto que sua tecnologia é,
também, importada e sua operacionalidade através de satélites, GPS e
transgênicos nada tem a ver com o nosso homem do campo. Trata-se de uma
agricultura usuária da área rural, mas, notadamente gerida técnica, comercial e
financeiramente nos grandes centros cosmopolitas. Com o cambio atual geramos
bons empregos na China, EUA e Europa; e subempregos no Brasil.
Deixando o
economês para lá, podemos ver que a história do Brasil muda de atores e
cenários, mas continua sendo palco de um mesmo enredo colonialista. Onde a soja
é o novo pau-brasil e o iPad o moderno e inusitado espelhinho do século
XXI.
Se a
humanidade nasceu de uma mesma origem, a chegada dos europeus por aqui
significa um momento muito especial. Daí, termos a responsabilidade de
encaminhar ao desenvolvimento comum a terra que permitiu o reencontro de toda a
humanidade, emblematicamente ocorrido num transformador Domingo de Páscoa.
Publicado no jornal Cinform
11/04/2011 – Caderno Emprego
Publicado no Jornal do
Comércio / SE – Editorial abr/2011
Publicado na revista
Tecnologia da Informação & Negócios nº 00/2011 – edição inaugural
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