Tenho evitado escrever
neste espaço sobre assuntos que estão muito presentes no cotidiano, uma vez que
a mídia está abordando espaçosamente esta notícia por jornalistas e
articulistas, certamente muito qualificados. Porém, por ser a “palmada
educativa” que pais aplicam em seus filhos uma temática atinente a educação,
entendo que devo contribuir com o debate por meio desta reflexão de natureza
muito pessoal.
O tema está em evidência
na mídia em decorrência do envio de Projeto de Lei que altera o Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA). Numa leitura mais cuidadosa percebe-se que sua
interpretação abrange a proibição da chamada “palmada educativa” dada pelos
pais em seus filhos menores. Entendo que tal lei, embora de teor válido,
extrapola a realidade sociopolítica brasileira invadindo a instituição família
e por focar assunto de natureza secundária ante a saúde pública, a educação
escolar formal, a segurança pública – inclusive de crianças em salas de aula
vitimadas por balas perdidas, o direito a privacidade, a moradia, dentre outros
inúmeros problemas nacionais, infelizmente tradicionais.
Não seremos país de
primeiro mundo por termos belas leis, mas sim por conta de nossos costumes e
realidade local. Vários autores definem que possuir leis distantes dos costumes
é uma característica dos países subdesenvolvidos. Consequentemente, enquanto
nossas leis forem desencontradas de nossas práticas estaremos irremediavelmente
no terceiro mundo.
Como educador, penso ser
muito mais desastrosa a educação sem a imposição de limites do que com alguns
exageros destes. Explico melhor: não defendo em nenhuma hipótese a prática de
castigos físicos ou psicológicos como medida educativa, mas o outro lado da
moeda tem feito estrago maior na educação dos filhos. Existe a indispensável
autoridade amorosa dos educadores que deve conduzir as crianças para a formação
de bons hábitos e virtudes, impregnando o futuro adulto com valores fundamentais
para a cidadania e o respeito à sociedade.
A educação sempre deve
incomodar um pouco o aprendiz, visto que este deve sair do patamar atual para
outro mais elevado e isto sempre exigirá esforço. Sob a ótica de Piaget, o
processo de aprendizagem decorre do provimento de cômodos para a assimilação
dos novos conteúdos até que estes cômodos se esgotem exigindo a construção de
outros superiores adequados a novos níveis de cognição, o que o ilustre
pesquisador chamou de acomodação. Assim, a criação de novos cômodos exige um
esforço de motivação e investimento pessoal para crescer cognitivamente
permitindo um pensar cada vez mais abstrato e complexo.
Na visão globalizante da
pedagogia Waldorf, a idade dos 7 aos 14 anos contempla a fase ideal para a
criação de hábitos e ritmos saudáveis. Estes mesmos hábitos só são sedimentados
com a presença firme de adultos que acompanham, cobram, orientam e persistam
para que se consolidem permanentemente. Por exemplo, crianças que são sempre
acordadas cedo nessa faixa etária cultivarão o hábito pelo resto da vida, assim
como escovar dentes, tomar banhos, ser cortez com o próximo, respeitar o espaço
coletivo, gostar de ler, dentre outros bons ou maus costumes que também são
implantados nessa época e eternizados com o passar do tempo.
Todos nós adultos sabemos
o quanto é trabalhoso acompanhar crianças na construção de valiosas virtudes.
Sabemos também que as atribulações da vida nos estressam e que nossos filhos
querem toda a nossa atenção gerando grandes conflitos emocionais. É perfeitamente
comum que pais percam a calma com seus filhos, isto é, tornem-se intolerantes e
impacientes. Mas não se admite que um adulto agrida compulsivamente e
covardemente uma criança. Sei que o mais importante para a criança é ver
autenticidade no amor dos pais, a segurança que inspiram, é poder dizer com
convicção para os amigos que seus pais são verdadeiros com ele, e saber da
intensidade dos poucos momentos que passam juntos.
Pessoalmente, levei
palmadas educativas na minha infância, em casa, e afirmo que não me lembro de
nenhuma delas. Porém, com toda certeza, lembro das broncas que ouvi e dos
conselhos que recebi de meus pais. Sou muito grato pela educação que me deram e
a eles devo muito do meu caráter.
Me preocupa mais a
ausência de bons exemplos da programação da TV, a permissividade, a indiferença
dos educadores e pais, a erotização precoce, a utilização livre da internet, a
falta de bons exemplos concretos dos adultos ou a agressão moral sem
testemunhas, do que a imposição de limites às crianças, como as palmadas
educativas. Afinal, como ouvi de um palestrante: “um pai que não diz não ao
filho, não ensina o filho a dizer não ao traficante”.
Finalmente, só acredito em
educação verdadeira com exemplo vivo e coerência. Então, que o Estado
Brasileiro dê seu bom exemplo primeiro.
Publicado no jornal Cinform
02/08/2010 – Caderno Emprego
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