Toda sociedade procura se
perpetuar e, para isso, utiliza da educação como forma de reproduzir seus
valores, suas conquistas e sua visão de mundo para as novas gerações. Assim, em
todas elas existe um modelo de educação, ainda que não seja explicito e que as
pessoas da comunidade nem tenham consciência dele.
A educação é um direito de
cada um, tornando-se então um dever nosso educar a outras pessoas. Daí, nessa
relação educador-educando forma-se um vínculo profundo que deve fazer uma
passagem útil, feliz e comprometida com o destino do educando. Importante dizer
que nesse binômio educador-educando ocorre sistematicamente a troca de
posições. Ora somos educadores, ora somos educandos. Afinal, existe melhor
momento de aprendizagem do que quando ensinamos?
No mundo atual as
exigências educacionais são bem mais rigorosas que em tempos passados. A
educação sempre esteve diretamente atrelada ao mundo do trabalho. Em tempos
remotos, acompanhar o pai ou a mãe em suas atividades diárias era suficiente
para preparar o jovem para a vida, num processo de educação difuso e sem
metodologia. Hoje, os filhos raramente têm a oportunidade de acompanhar os pais
no trabalho e quando o fazem não o compreendem claramente, isso porque o trabalho
tornou-se cada vez mais abstrato e menos tangível aos sentidos, exigindo grande
capacidade cognitiva do trabalhador.
A educação formal é o
calcanhar de Aquiles da moderna economia. E aqui no deparamos com uma enorme
ameaça: a importação de modelos e metodologias que não nos respondam às nossas
reais necessidades porque só há educação significativa com contexto. E todo
contexto, por sua própria natureza, é ricamente interdisciplinar.
Nos Estados Unidos, há
muitos anos atrás, seis nações indígenas assinaram um tratado de paz com os
Estados de Virginia e Maryland. Ocorre que os governantes brancos ofereceram
vagas em suas escolas para jovens índios e receberam como resposta uma carta
com a recusa e o agradecimento dos chefes das seis nações, nos termos a seguir,
que mais tarde Benjamin Franklin adotou o costume de divulgá-la.
“... Nós estamos convencidos de que os senhores desejam o bem para
nós e agradecemos de todo coração. Mas aqueles que são sábios reconhecem que
diferentes nações têm concepções diferentes das coisas e, sendo assim, os
senhores não ficarão ofendidos ao saber que a vossa idéia de educação não é a
mesma que a nossa.
... Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas
do Norte e aprenderam toda a vossa ciência. Mas, quando eles voltaram para nós,
eles eram maus corredores, ignorantes da vida da floresta e incapazes de
suportarem o frio e a fome. Não sabiam como caçar o veado, matar o inimigo e
construir uma cabana, e falavam a nossa língua muito mal. Eles eram, portanto,
totalmente inúteis. Não serviam como guerreiros, como caçadores ou como
conselheiros.
Ficamos extremamente agradecidos pela vossa oferta e, embora não
possamos aceitá-la, para mostrar nossa gratidão oferecemos aos nobres senhores
de Virgínia que nos enviem alguns dos seus jovens, que lhes ensinaremos tudo o
que sabemos e faremos, deles, homens”.
Certamente nessa carta dos
índios estão algumas das questões mais importantes da educação que se discute
hoje. Assim, fica evidenciado que não há um modelo único nem mesmo uma forma
única. Creio até que nem exista uma educação melhor que outra se ocorrem em
contextos diferentes dada a impossibilidade de comparar culturas e valores.
Precisamos cuidar de nossa
educação filtrando modelos importados inadequados e desajustados a nossa
realidade local. Diferentemente da situação tão delineada e distante entre as
partes pacificadas relatada na carta acima, o Brasil tem na mistura de povos e
etnias um valor cultural diferenciado para nossa educação.
Tenho certeza que
encontraremos os legítimos valores brasileiros entre os extremos representados
por personagens clássicos. De um lado, Iracema, a romântica virgem dos lábios
de mel, índia que por fidelidade a seus princípios, renuncia o alto posto
tribal que ocupa, para, uma vez apaixonada, viver o drama de casar com Martim,
branco guerreiro que combate seus irmãos índios. Fato que a faz viver profundo
drama, mas que dessa união nasceu Moacir. E opostamente, Macunaíma, negro,
filho de índia, nascido na selva que se torna branco para ir para São Paulo,
revelando sua natureza de herói sem nenhum caráter. Embora nenhum destes seja,
por si, a expressão fiel do povo brasileiro, também não há como descartá-los:
ambos comungam da miscigenação como elevado valor brasileiro.
Respeitemos a riqueza de
nossa cultura, farta de lendas, músicas, folclore, autores famosos e, acima de
tudo, miscigenada como nenhuma outra, para juntos encontrarmos os bons e
profundos valores próprios que estão presentes no íntimo de cada brasileiro e
ajudar a fazer do Brasil uma Nação (com N maiúsculo mesmo).
Publicado no jornal Cinform
30/08/2010 – Caderno Emprego