terça-feira, 31 de março de 2020

Yes! Nós temos corona



Um vírus chinês, talvez inspirado naqueles de computador, prospera como visitante não-convidado provocando danos bilionários mundo afora.

Igualmente tênue é a fronteira que separa a pessoa física da pessoa jurídica no nosso Brasil. Por certo, em um país que possui o tecido empresarial oficial composto por mais de 99% de micro e pequenas empresas e que seus correspondentes empresários repetem a mesma sofrível formação socioeconômica e escolar do trabalhador médio brasileiro, confirma a precariedade presente em nosso ambiente produtivo.

Com efeito, o reino empresarial brasileiro é uma fotografia da nossa, digamos, injusta ordem social. De fato, as dificuldades que envolvem a gestão de negócios vão desde a nossa incivilizada burocracia ao senso comum que não vê a importância da atividade produtiva na construção de uma nação, passando pelos baixos índices de produtividade.

Facilmente caímos na tentação de usar as lentes acadêmicas para traduzirem uma realidade tão dura e distante dos livros. Assim, choca o bom senso a discussão rasa que presenciamos entre a saúde das pessoas (físicas) e a sobrevivência das empresas, como se houvesse nas paragens de Macunaíma essa clássica separação. O que vemos aqui ainda é a absoluta e indevida mistura das contas e dos atos das pessoas físicas e jurídicas, encarnados em um só.

Grosso modo, nos disse o IBGE em março/19, que menos da metade dos brasileiros corresponde aos 92 milhões da população ocupada. Desta, 33 milhões são os trabalhadores de carteira assinada e 11 milhões os funcionários públicos, que somados representam menos da metade da população ocupada. Então, quem são os demais? Descontados os 6 milhões de trabalhadores domésticos resta-nos 42 milhões de guerreiros produtivos assim divididos:  12 milhões de trabalhadores sem carteira assinada; 25 milhões trabalhando por conta própria; 5 milhões de empregadores. Repito, números aproximados.

Ao recortarmos os números acima, fica claro que metade da nossa população ocupada é formada por empresários, autônomos e empreendedores formais ou não. Quem são esses? Pessoas físicas com certeza, porém todos, sem exceção, protagonistas do palco econômico como pessoa jurídica, formal ou não. Pois, independentemente da formalização praticam atos e fatos típicos das pessoas jurídicas e fazem circular o dinheiro e gerar riqueza. Se para os assalariados os meses são longos, para estes os dias são intermináveis.

Reforça nosso entendimento um vídeo disponível nas redes sociais que, sem fazermos juízo de valor, inspirou o título deste texto. Se trata do conflito entre um vendedor de bananas no centro da cidade com fiscais do município de Aracaju. Na cena os fiscais apreendem as mercadorias e o carrinho do ambulante que reage violentamente agredindo física e verbalmente os agentes municipais. Uma cabal demonstração da fusão entre pessoa física e jurídica, ou seja, quando desequilibra a atividade econômica se desequilibra a pessoa física, logo a saúde. Não distante da nossa realidade há registros de suicídios de empresários por motivações econômicas. Há como separar saúde de economia no Brasil?

Não faz sentido a polarização que presenciamos na política brasileira, alimentada por uma mídia igualmente tendenciosa e apaixonada. Pelo nível dos debates e das publicações correntes, arriscamos perder em inteligência para o mais primitivo vírus. Será que o que é bom para a saúde é ruim para a economia? Será que indicador de saúde é só coronavírus? Será que economia se contrapõe à saúde no seu sentido mais amplo? Será legítimo crescer politicamente pelo caminho da desinformação nesse cenário de calamidade? Será correto auferir privilégios nesse momento? Qual o limite entre o impacto da doença e as mortes provocadas por um caos econômico?

Respostas difíceis, exceto para os egoístas e para os aproveitadores de plantão. Notadamente, se não há verdadeiro isolamento horizontal no País como alguns acreditam, posto que porteiros, caminhoneiros, vigilantes, motoristas, motoboys, policiais, operadores da saúde, padeiros, distribuidores, mecânicos, farmacêuticos, bancários, comerciários, jornalistas, dentre inúmeros outros profissionais, continuam trabalhando invisíveis para muitos, mas gerando conforto e abastecimento para todos.

Senhores políticos e autoridades diversas, já estamos irremediavelmente prejudicados na saúde e na economia – o dano já é efetivo. Assim, é hora de desarmar os espíritos e fazermos uma única frente nacional que responda com assertividade ao desafio imposto. Só haverá saída para o enfrentamento do novo vírus com a união de todos e a participação ativa, honesta e inteligente dos mais diversos setores que compõem o mosaico de nosso grande Brasil.

Paulo do Eirado Dias Filho
Pedagogo, Diretor Superintendente do Sebrae/SE


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