segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Para quem trabalhamos?



     Nos minutos em que se lê este texto, um número infinito de pessoas realiza seus trabalhos. Certamente, muitos estão preparando produtos ou serviços para nós mesmos. São anônimos trabalhadores que, juntamente com os empregadores, fazem parte de uma imensa rede de atividades econômicas posta à nossa disposição.


O advento da revolução industrial promoveu incrementos de produtividade inimagináveis se comparados à própria capacidade humana. Dessa forma, um trator realiza a mesma tarefa que 50 homens, por exemplo. Semelhantemente, um tear industrial substitui dezenas de trabalhadores.


Do ponto de vista ambiental, o ganho de produtividade e o elevado consumo de energia têm promovido impactos desastrosos, por demais divulgados. Já sob a ótica social, essa nova relação de trabalho, decorrente do uso intensivo de tecnologias e larga produção de excedentes, traz uma inovação de significado profundo, ainda hoje pouco assimilada culturalmente por todos. Trata-se da produção exclusivamente direcionada para terceiros.


Historicamente, associamos o trabalho à provisão de bens e insumos  necessários à manutenção de nossas famílias. Dessa maneira, o homem da idade média plantava para consumir, construía sua própria moradia, fabricava suas rudes ferramentas, domava os animais que serviam como alimentos, segurança e tração. Além disso, fiava suas vestes e produzia os utensílios domésticos, dentre outros afazeres como de cortar lenha para seu aquecimento.


Culturalmente, como foi dito, ainda enxergamos o nosso labor do dia a dia sob essa visão inadequada à moderna realidade presente. O que mudou? A mudança mais significativa se deu com a formação de uma imensa rede de serviços à nossa disposição, integrada por inúmeros e anônimos nós e canais de relacionamento. Simbolicamente, a internet revela a mesma topologia, isto é, a organização esquemática, refletindo a moderna estrutura econômica mundial, na qual ninguém mais trabalha para si e sua família.


Nesse contexto, a remuneração, em suas diversas formas de dinheiro, é o atual meio provedor de conforto, segurança e lazer das famílias de trabalhadores, e não mais a capacidade de trabalho físico aliada às habilidades de produzir diretamente tudo o que se necessita consumir.


Hoje, trabalhamos exclusivamente para os outros. E outros trabalham para nós. Muitos estão produzindo o pão que consumiremos mais tarde, a gasolina que utilizaremos adiante, o jornal que compraremos semanalmente, a aula que meu filho assistirá, o filme que nos emocionará, a roupa da próxima estação que lhe cairá muito bem, e o remédio que esperamos não precisar usar. Simultaneamente, estamos todos trabalhando para suprir não sabemos quem. Mas temos consciência de que só sobreviveremos nesse mundo econômico se fizermos a parte que nos cabe da melhor maneira que pudermos.


Assim, se você produz cachorro-quente, por exemplo, sabe que seu sucesso profissional está baseado no seguinte principio pétreo: fazer o cachorro-quente da melhor forma que puder, mesmo sem saber quem irá degustá-lo.  Igualmente, deve pensar e agir o fabricante de pneus ou o de guarda-chuvas. Esse é o mundo atual onde quem ensina sobre licitações públicas nem sequer possui empresa fornecedora para governos. Ou, paralelamente, quem produz pregos em alta escala não necessitará nem de um segundo de sua imensa produção para assegurar seu abastecimento vitalício deste primitivo material de construção, devido a produção de excedentes que os modernos meios de produção nos garantem.


Com efeito, fazer o melhor que pudermos sem saber quem se beneficiará de nosso trabalho tem o mesmo significado que “fazer o bem sem olhar a quem”. Se formos conscientes disso, teremos a inédita oportunidade histórica de vivenciar a fraternidade diariamente por meio de nosso trabalho.


Fraternidade e confiança formam a base de toda atividade econômica moderna. Queiramos ver ou não, só nos realizaremos profissionalmente se nos educarmos para servir através de nosso trabalho. Então, desafio o leitor a fazer uma análise de seu trabalho observando quem se beneficia diretamente de suas atividades, e verá seguramente que é o ‘próximo’, por mais distante que seja.     





Publicado no jornal Cinform em 12/09/2011 – Caderno Emprego


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