Guardo, com muito zelo, um
exemplar da revista Informática Exame, de março de 1996. Esse querido exemplar
me traz a perfeita noção do quanto nossa sociedade se transformou em tão pouco
tempo. Lá está uma chamada para uma edição especial sobre tecnologia da
informação com o seguinte título: “entre no mundo da informação sem limites”,
com promessas de apresentar “a internet e o boom do comércio eletrônico”.
Acontece que no anúncio consta um número de telefone à disposição dos
promissores anunciantes, mas não há email ou endereço de internet disponível
porque simplesmente, em 1996, não existia internet no Brasil, exceto algumas
ilhas da rede. Nesta mesma revista, em outra página, tem um cupom para “acesso
direto” aos anunciantes, via Correios, sem necessidade de selar. Encontro,
ainda, uma propaganda de um computador Pentium 100, em imperdível promoção por
R$ 4.200,00, cerca de R$ 8.000,00, hoje, se corrigido pelo dólar, ou seja, dez
vezes o preço de um PC atual de capacidade muito superior.
Assim era o mundo em 1996,
ano da promulgação da atual LDB – Leis de Diretrizes e Bases- que regulamenta
todo o sistema educacional brasileiro. Embora seja uma Lei moderna, não foi desenvolvida
para o contexto atual, o mundo da EaD - educação a distância, das redes
sociais, do lap top para cada criança, das lan houses cidadãs, do ENEM, do
ENADE, das cotas raciais (sic), dentre outras coisas.
Diante de uma
transformação social tão veloz, há de se supor que, assim como muitos jovens de
hoje são completamente incapazes de imaginar o mundo sem celular e sem
internet, também, nos é impossível saber quais novas profissões surgirão em
muito pouco tempo, oportunizando trabalho, inovação, e até uma total
dependência tecnológica que não nos faz
a menor falta hoje, mas será indispensável em pouco tempo.
Paralelamente, existem
coisas que não mudam, resistindo ao tempo através da sistemática e pobre
polarização de valores. Algo como assim ou assado, luz ou escuridão, mercado ou
Estado, dentro ou fora. Creio que tal estreiteza de visão está imbricada de
pseudo-ideologia da dialética marxista, na qual é necessário se opor
tecnicamente, para criar sustentação ao discurso, ainda que distorcido. Situação
em que, uma frase apenas, isolada do contexto é usada para desqualificar uma
palestra ou uma tese. É uma forma simplista de “vender” a realidade.
Como dizem os antigos,
desde que Adão era cadete, isto é, desde quando nossos mais remotos
antepassados começaram a observar as estrelas, e que perceberam a
tridimensionalidade das coisas presentes no mundo. A partir dos astros,
percebemos o tempo cronológico dividido em passado, presente e futuro. Também
aprendemos com o céu a nos deslocar no espaço físico terrestre,
coincidentemente, em três dimensões: altura, largura e profundidade.
Creio que a
tridimensionalidade nos enriquece a compreensão do mundo que vivemos. Desta
forma, se imaginamos um circulo, podemos ver que o seu centro pertence a dentro
e a fora simultaneamente, igualmente a sua borda. O mesmo acontece com os modelos de mercado e
Estado que desconsideram a existência do terceiro setor, notadamente quando
afirmamos que este é não-governamental e sem fins lucrativos. Só dizemos o que
ele não é, pois falta-nos a tridimensionalidade natural para entendermos o
mundo. Entre os pólos existe o limiar assim, como entre a luz e a escuridão
estão todas as cores.
Penso que perguntas
recorrentes do tipo “aluno ou cliente?” merecem respostas mais complexas e menos
ideologizadas. Todo aluno deve ser tratado como cliente até que se comece um
verdadeiro trabalho pedagógico, isto é, até por o pé na sala de aula. A partir
daí passa a ser aluno. A relação da escola com o aluno deve ser profunda, pois até o destino deste está sendo
definido. Portanto uma relação de profundidade, largura e altura superior à de
uma empresa com seus clientes.
Igualmente, quando
perguntado se a escola é uma empresa? Respondo que sim. A escola é uma empresa,
seja do ponto de vista institucional, seja pelos compromissos orçamentários e
financeiros que possui, ou ainda, pela desafiante sobrevivência mercadológica.
Mas, acima de tudo, é uma empresa, por ter que ser sustentável para honrar seus
compromissos econômicos e educacionais. Isso vale inclusive para a escola
pública que tem que apresentar resultados de seu trabalho pedagógico
maximizando seus recursos orçamentários.
Devemos fugir da
superficialidade na observação da realidade. Pedagogia e gestão são frutos de
uma mesma ciência e, portanto, não podem divergir em seus princípios mais
básicos. Tridimensionalmente, devemos educar o pensar, o agir e o sentir na
pedagogia. Analogicamente, os gestores necessitam de conhecimentos, habilidades
e atitudes, ou seja, competência de suas equipes. Todos os grandes autores
afirmam ser a educação casada com o trabalho.
Publicado no jornal Cinform
13/09/2010 – Caderno Emprego
Publicado no Jornal do
Comércio / SE – Editorial set/2010
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