A poesia é de quem lê, e
não de quem escreve. A poesia é a experiência do leitor diante do poema. Ao
autor restou o poema e a imaginação sobre qual é a extensão de sua obra. Nas
artes, em geral, os limites são improváveis, o observador faz parte da obra e a
complementa com sua exclusiva interioridade.
Costumo dizer,
quando falo com jovens estudantes, que o mundo tem o tamanho da nossa
interioridade. Assim, quem desenvolve sua vida interior através de estudos,
meditação, observação, escuta e diálogo está ampliando seu mundo. No Brasil,
por exemplo, vivemos em uma era plural, na qual temos seres humanos vivendo
experiências espaciais, temos até astronauta brasileiro (lembram-se?), e outros
vivendo neste nosso país como se vivia há dez mil anos atrás, sem domínio da
agricultura, dos metais, da cerâmica, da linguagem escrita, da criação de
animais, e outras marcas relevantes da linha do tempo da tecnologia, em
agrupamentos indígenas isolados ainda presentes na Amazônia.
Essa pluralidade
dá a possibilidade de nos colocarmos em realidades diferentes diante de um
mesmo cenário. Os modernos meios de comunicação nos ampliaram o mundo e
encolheram o planeta. Observando-se um mesmo evento, cada observador terá
visões e interpretações diferentes, alguns mais profundas, como quem domina o
assunto; outros mais superficiais, com baixa interatividade com o fenômeno.
Porém, externamente o evento manifestou-se igual para todos.
A arte deve estar
presente em qualquer educação que se preze em proporção equivalente a formação
intelectual. A arte é a educação do emocional, do conviver saudável e
harmônico, da expansão da interioridade. Porém, falar em arte na educação é discurso
fácil. Tem escola fazendo visita a museu ou estudando quem foi Van Gogh, e
dizendo que é educação artística. Desculpem-me, mas isso é educação cognitiva e
não artística, talvez seja estimulante para formar críticos, mas insuficientes
para formar artistas. Arte tem que ser vivida, desafiadora para promover o
crescimento. Arte é aprender a dominar a água numa pintura com guache, fazer de
um violino, por exemplo, uma extensão do seu corpo e dos seus sentimentos. Arte
é vida e comunicação!
A educação do
intelecto com a intensidade atual que se dá nas escolas é a causadora (e
conseqüência também) do mundo caótico e desequilibrado de hoje. Só somos bons
sobre o que reduzimos para dominá-lo. Desta forma, somos analfabetos, apesar
dos nossos diplomas, em questões ambientais. Somos irresponsáveis, quando
inviabilizamos a vida na Terra para nossos filhos e netos. Também, do mesmo
jeito que se estuda para provas escolares, agimos priorizando o curto prazo
sobre o longo prazo: temos que levar vantagem em tudo – Diria o Gerson. Que
educação é essa?
Vejamos exemplos
de nossas ações reducionistas: Quando trabalhamos com os minerais extraímos
suas preciosidades deixando em seu lugar apenas materiais amorfos e estéreis,
descristalizados. Ao atuarmos sobre os vegetais, os mineralizamos com a adição
abusiva de sais fertilizantes. Já, sobre os animais, os confinamos
impiedosamente, reduzindo-os a uma vida vegetativa. Quanto aos humanos, nós os
tratamos como uma manada, através da moda padronizadora e escravizante, e outras
criações de desejos consumistas coletivos produzidos pela mídia de massa,
reforçados via educação reprodutora destes valores. É o educar a todos como se
fossem um só, infelizmente, tão presente em nossa escola.
Vivemos a época
da valorização da inteligência. Muitos são mais preocupados em ver os filhos
bem colocados no vestibular que em vê-los felizes e bons. Os quatro pilares da
educação para o século XXI, proposto pela UNESCO, prioriza o aprender cognitivo
com tanta ênfase que até nos orienta a “aprender a ser”. Aprender? O mesmo se
dá quando falamos em inteligência emocional. Pergunto: Inteligência? É essa a
palavra certa para emoções? Talvez estejamos a criar uma sociedade cada vez
mais fria e distante da visão holística do ser humano dotado de corpo físico,
vital, emocional e da sua individualidade, ou identidade espiritual.
Será que nosso
modelo educacional está favorecendo a formação de pessoas com fraqueza de
caráter? Será que nossos bandidos, estupradores e assassinos não passaram por
escolas? Espero que não, mas posso estar enganado. Vejo muitos profissionais de
nível superior (sic) criando procedimentos em benefício próprio lesando seus
clientes ou pacientes. Vejo profissionais de confiança (sic) que traem seus
clientes por trinta dinheiros. E esses, também não passaram pela escola?
Será que uma
escola que não é capaz de observar e agir sobre desvios de desenvolvimento do
caráter, dificuldades elevadas de convivência social e outras patologias
sociais de seus alunos, ainda que aprovados no vestibular de medicina, pode
dizer que educou?
Certa vez, um
velho pajé disse a um jovem: “dentro de mim existem dois cachorros. Um é fiel e
protetor companheiro. Outro de péssima índole, traidor e ladrão. Ambos vivem
brigando sempre”. Então, o atento ouvinte lhe perguntou: “Quem vencerá essa
briga?” E o sábio índio respondeu: “Aquele que eu alimentar”.
Fazer arte é
exercer a liberdade plenamente e por este caminho educar o caráter. A educação
proporcionada pela vivência artística chega como alimento à luz da alma humana,
tornando-a irradiadora ao próximo.
Publicado no jornal Cinform
22/03/2010 – Caderno Emprego
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