“Primeiro a gente faz de conta, depois se torna...” (Guimarães Rosa).
É curioso
como as pessoas que costumam adotar uma visão de longo prazo se diferenciam das
demais. Em geral, são mais empreendedoras e deixam marcas profundas nas suas
biografias e das pessoas que lhes são mais próximas. A visão de longo prazo faz com que os
obstáculos do dia a dia se tornem menores, às vezes até vistos como pequenas
adversidades. Já para os mais imediatistas, estas mesmas adversidades se tornam
barreiras intransponíveis por não saberem aonde querem chegar, conduzindo-os a
perda da fraca orientação que possuem ante tal obstáculo.
Alguns
autores definem os empreendedores como visionários, pessoas que promovem as
mudanças que resultarão no cenário futuro. Eu, particularmente, considero que
empreendedores são construtores de sonhos. São aqueles que idealizam um sonho,
definem estratégias e táticas para sua realização e o constroem obstinadamente.
Aqui não há nada de mágico. O sonho é construído c-o-t-i-d-i-a-n-a-m-e-n-t-e,
tijolinho a tijolinho. E, acreditem, à base de muita renúncia, superação e
sacrifício, extensivo aos familiares.
Certamente todos nós
conhecemos pessoas assim, que trabalham sempre para a realização de um sonho
empresarial, ou político, ou social, ou religioso; nem sempre com êxito.
A visão de
longo prazo nos vincula mais ao coletivo que a visão imediatista de natureza
mais egoísta. Também, nos torna mais responsáveis para com nossos descendentes.
É raro aquele que deseja mal ao mundo de 2030, igualmente raro é aquele que
hoje esteja agindo para que lá encontremos um mundo melhor. Queremos o bem lá
na frente, mas infelizmente, não estamos construindo isso agora. É o que diz
uma pesquisa do Ibope encomendada pela ONG internacional WWF: “A elite
brasileira é ecologicamente inviável – Impacto de classe A e B sobre o ambiente
no país é comparável ao dos EUA”. Precisamos acoplar o futuro que sonhamos com
nossas ações do presente.
Tem uma
estória que diz que “o diabo paga à vista e Deus só paga à prazo”. Isto é,
precisamos renunciar às tentações do presente para construirmos um futuro
melhor. Em freqüentes oportunidades, agimos por ansiedade e insegurança com o
propósito de assegurarmos logo um resultado a nosso favor, na melhor expressão
da lei do Gerson. Quantas crianças são alfabetizadas precocemente? Quantas
crianças são adultizadas? Quantos pais, por ansiedade, são aceleradores dos
processos vitais de desenvolvimento de seus filhos sem respeitar a velocidade
natural?
Dias atrás,
li uma reportagem de um jornal de São Paulo que dizia: “Brasileiro gasta mais
com carro que com educação – Fenômeno ocorre mesmo entre famílias com filhos,
mais ricas e escolarizadas”, e pensei que aí estava um confronto emblemático
entre a visão de longo prazo e a de curto prazo. É tentador sentirmos o
imediato cheirinho de carro novo, ainda que saibamos que esta atraente
propriedade organoléptica possa nos comprometer ou inviabilizar o futuro. Todos
sabem que o ingresso de jovens no mercado de trabalho está altamente
competitivo, e que as exigências curriculares e de titularidade são crescentes
para a realização profissional. Também, sabem que o conhecimento é condição
basilar da moderna economia. Mesmo assim, a maioria das pessoas prefere o carro
(que está novo por uns dias), ainda que neste mesmo jornal paulista outra reportagem
diga: “Sobra 1 milhão de empregos qualificados – vagas não são preenchidas por
falta de qualificação, diz Ministério do Trabalho”.
Termos bons
sonhos e sabermos o que é melhor para nossos filhos e netos não são
suficientes. Precisamos ser educados para termos coerência e sermos mais
conscientes de nossos desencontros. Estudar ética, conhecer educação
financeira, planejar a vida, ter religiosidade e agir na construção do futuro
sonhado nos ajudarão muito. A qualidade da mente e do espírito é fundamental.
Não basta confiarmos em nossos planos, precisamos confiar sim, em nós mesmos e
nos outros.
Quando
nossas ações forem paralelas aos nossos mais nobres desejos, o encontro será
inevitável na infinitude de nossos sonhos.
Publicado no jornal Cinform
03/08/2009 – Caderno Emprego
Publicado no Jornal do
Comércio / SE – Editorial jul/2009
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