No final do
século XX a UNESCO encomendou a elaboração de um relatório que apontasse a
direção a ser dada para a educação no novo século. Tal relatório, conhecido
como "Delors", indicou que os processos pedagógicos deveriam
trabalhar a partir de 4 pilares: aprender a aprender, aprender a fazer,
aprender a conviver e aprender a ser.
Neste
momento vou me ater exclusivamente a comentar sobre o “aprender a fazer”, pois
é aqui que entra o empreendedorismo mais fortemente na educação formal.
Infelizmente, nas nossas escolas esse importante pilar é de difícil aplicação,
por quê? Porque educar o fazer, implica em trabalhar a vontade de cada um.
Assim, a escola tem que dar oportunidade a cada um individualmente de expressar
seu querer e as ações decorrentes dele. Neste âmbito, se descobrem talentos
ainda não manifestos e se desenvolvem importantes habilidades.
Nosso modelo
escolar, influenciado pela educação jesuítica, busca como ideal “educar a todos
como se fossem um só” e, consequentemente, temos aí uma pedagogia conformadora,
doutrinaria, que valoriza apenas os processos silenciosos e isoladores do
pensar, da memorização e da cognição. Em educação, é forte a tentação de
reproduzir o mesmo que recebemos, de repetir as aulas de um tempo que não
voltará, para alunos que não são os mesmos, em uma sociedade com valores cada
vez mais distantes. Em resumo, educar para um futuro que com certeza não virá.
Dito dessa
forma, pareço defender novidades e inovações na escola, mas não é isso. Minha
posição vem em defesa de uma educação que favoreça o desenvolvimento humano
integralmente: eduque-se o pensar, o sentir e o agir harmoniosamente. Do que
conheci até hoje, a linha pedagógica mais completa, por assim dizer, é a
Pedagogia Waldorf, alemã, cerca de 1000 escolas no mundo, 90 anos de existência
e mais de 50 deles no Brasil. Lamentavelmente desconhecida até nas faculdades
de pedagogia devido, creio, a sua independência mercadológica. Noutro artigo
dedicarei atenção exclusivamente a esse tema. Voltemos ao empreendedorismo.
Num passado
próximo, ser empreendedor era sinônimo de ser empresário, ser capitalista, ou
até ganancioso. Isso deriva do fato de chamar-se empreendedor, no século XVIII,
aos que “compravam por preço certo para vender por preço incerto”, levando o
comerciante a assumir riscos e obrigar-se a agregar algum valor ao produto
visando convencer o comprador. Hoje, a definição é outra, sabemos que ser
empreendedor é uma característica comportamental. É um conjunto de atitudes e
hábitos que faz uma pessoa ser empreendedora, e como tal, estas atitudes podem
ser adquiridas e desenvolvidas na escola e, uma vez adquiridas permitirão ao
empreendedor aplicá-las onde bem entender. Alguns vão efetivamente valer-se
desta habilidade para ganhar dinheiro, mas afirmo que será uma minoria. O
empreendedor é um visionário que buscar construir seus sonhos, e aí residem
seus valores fundamentais – ganhar dinheiro é secundário, é uma conseqüência de
sua obra.
Empreendedora
exemplar foi Irmã Dulce, que sonhou e dedicou-se a acolher e cuidar de doentes
pobres da Bahia, deixando um legado indiscutível de santidade e um dos maiores
hospitais públicos do Brasil em pleno funcionamento até hoje, o Hospital Santo
Antonio. Sua biografia é marcada por inconformismo e gestos revolucionários
como, invadir casas desabitadas para abrigar tuberculosos moradores de rua e
iniciar seu hospital dentro do galinheiro do convento com 70 leitos. Quem ler
sobre Irmã Dulce encontrará uma vida recheada de ações voltadas para o mesmo
fim: construir seu sonho a partir unicamente de sua vontade infinita.
Outro
empreendedor emblemático porque realizou uma grande conquista a partir do nada,
foi o já falecido Deputado Federal Enéas. Analisem comigo: dispor de meia
dúzia de segundos de televisão em horário eleitoral gratuito e tornar-se o
deputado federal mais votado da historia de São Paulo e do Brasil com mais de
1,5 milhão de votos é um fenômeno e tanto. Alias, desculpo-me por estar sendo
prolixo para falar deste personagem comunicador; deve ser porque meu nome não é
Enéas!
Nossas
escolas precisam “ensinar” os jovens a sonhar, a ter meta de vida, a exercitar
sua visão de longo prazo, a fazer seu plano de negócio e a caminhar na
construção desses mesmos sonhos. Nosso vínculo com o futuro é o agir, o futuro
é construído por nossas ações. Ora, se minhas ações não podem mudar o passado é
porque seu campo de ação não é aí.
Então, sim, no futuro!
Em Sergipe,
algumas boas iniciativas empreendedoras acontecem em escolas públicas e
particulares. A Junior Achievement, uma associação sem fins lucrativos,
centenária, faz um belo trabalho junto a escolas regulares de ensino
fundamental e médio. Também, vale à pena conhecer o trabalho desenvolvido nos
colégios estaduais Médici - Aracaju, Glorita Portugal – São Cristóvão, e
Edélzio Vieira de Melo – Capela. Nestas escolas e mais algumas outras,
Empreendedorismo é disciplina obrigatória no ensino médio e os alunos tem
oportunidade de aplicar o que aprendem em diversas atividades
interdisciplinares, feiras realizadas nas escolas, apresentações artísticas, e
até mesmo na Feira de Sergipe que acontece na Atalaia todos os anos em janeiro.
Encerro,
enaltecendo os professores de empreendedorismo dos colégios citados como
docentes exemplares e verdadeiros amigos de seus jovens alunos. Embora iniciada
em 2006, a
disciplina Empreendedorismo nestas escolas já apresenta inúmeros casos de
sucesso de alunos e ex-alunos no mundo do trabalho e em concursos diversos.
Empreendedorismo como disciplina curricular no ensino médio é uma dessas coisas
que só Sergipe tem!
Publicado no jornal Cinform
13/04/2009 – Caderno Emprego
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