terça-feira, 28 de abril de 2009

A pedagogia Waldorf


“Não há, basicamente, em nenhum nível, uma educação que não seja a auto-educação. [...] Toda educação é auto-educação e nós, como professores e educadores, somos, em realidade, apenas o ambiente da criança educando-se a si própria. Devemos criar o mais propício ambiente para que a criança se eduque junto a nós, da maneira como ela precisa educar-se por meio de seu destino interior.”  Rudolf Steiner.

Quero comentar sobre uma linha pedagógica que está presente em todos os continentes, em mais de 50 países, em cerca de 1000 escolas, das quais, 25 estão no Brasil. Embora forme a maior rede de escolas independentes do mundo, a Escola Waldorf, infelizmente, é ignorada na maioria das faculdades e nos livros de pedagogia do país. No Brasil, a primeira Escola Waldorf foi fundada em 1955 na cidade de São Paulo e está  funcionando até hoje.

Por que uma corrente pedagógica tão extensa e atualizada é descartada do meio pedagógico? Para mim, à primeira impressão é que o milionário mercado editorial do livro didático não é contemplado com seus livros descartáveis. Nessas escolas o aluno escreve seus próprios livros, expondo sua visão através de textos e desenhos vivos que são registros permanentes de suas experiências escolares. Também sei que as escolas Waldorf exigem intensa participação da família no seu cotidiano. Assim, pais que não estejam dispostos a acompanhar de perto a vida escolar dos filhos devem manter distância segura dessa pedagogia. Nessas escolas, professores costumam  visitar as residências de seus alunos e os pais são os organizadores das festas escolares. Trata-se de uma ação pedagógica peculiar da pedagogia Waldorf.

Tais escolas surgiram na Alemanha, em 1919, quando Emil Molt, diretor da fábrica de cigarros Waldorf-Astoria (daí o nome Waldorf), ciente dos resultados do trabalho pedagógico de Rudolf Steiner com um jovem hidrocéfalo considerado incurável que se formou com brilhantismo em medicina, o convidou para ministrar palestras motivacionais aos operários de sua fábrica.

Diante do sucesso destas palestras, que migraram do sentido meramente motivacional para um sentido profundamente revelador da natureza humana, o grupo de operários solicitou a Steiner a fundação de uma escola para seus filhos, no que Emil Molt de pronto concordou.  Rudolf Steiner concordou com a solicitação dos operários, desde que respeitadas as seguintes condições: aceitar crianças de qualquer procedência, ter um currículo unificado de doze anos e que os professores fossem administradores e dirigentes da escola. Esta floresceu espetacularmente e Steiner tornou-se seu dirigente mesmo morando distante.

Segundo Rudolf Steiner, "nosso mais alto empenho deve ser o de desenvolver seres humanos capazes de, por eles próprios, dar sentido e direção às suas vidas". A principal meta de uma Escola Waldorf é desenvolver na criança "cabeça, coração e mãos" através de um currículo ampliado e equilibrado em práticas educativas formadoras do pensar, do sentir e do agir. Este currículo insere música (flauta doce, contralto, orquestra e coral); artes (aquarela, marcenaria, modelagem e escultura em argila, desenho em branco e preto e perspectiva, fotografia, batik, estamparia, mosaico, tricô, crochê, tecelagem e tapeçaria), além de matérias como jardinagem, técnicas agrícolas e horticultura.

Outra característica que diferencia a Pedagogia Waldorf das demais é o acompanhamento que o professor da classe realiza junto a uma mesma turma durante sete anos. É tempo bastante para se assistir intensamente ao crescimento de uma criança da alfabetização ao ensino médio e ver o efeito da ação pedagógica, diagnosticar, avaliar e, quando necessário, corrigir rumos.

O que me fascina nesta pedagogia é o fato de a vivência e o descobrir precederem a teoria. Nela, a arte do ensino é fazer os alunos descobrirem por si o que se deseja ensinar. E ensinar para quem já sabe, ou melhor, para quem acaba de saber é lidar com o encanto da aprendizagem. É o sabor do aprender lúdico. Este método facilita o ensino dividido em épocas: ao invés de mudar de disciplina a cada toque da sineta, nestas escolas, ocorre uma imersão durante três ou quatro semanas em uma mesma matéria, intensificando a vivência e o clima geral de aprendizagem. Os alunos se renovam cada vez que conhecem e adormecem com o que aprenderam. Diariamente, as aulas de época ministradas pelo professor da classe são seguidas por aulas de língua estrangeira, educação física, religião, artes, artesanato ou musica a cargo de professores especializados.

No final da década de 80, tive a felicidade de matricular um filho em uma escola Waldorf em São Paulo e pude constatar essas informações “ao vivo e a cores”. O que mais me faz admirador desta escola, porém, não é a grandiosa fundamentação teórica fornecida pela Antroposofia – ciência que revela a sabedoria do homem como ser dotado de corpo, alma e espírito – mas sim, o amor que os alunos desenvolvem pela escola que os leva a espontaneamente zelar por ela e curtir as aulas. Tenho noticia que em Aracaju, além da formação de professores Waldorf através de cursos de pós-graduação (1400 horas), há também o embrião da nossa primeira escola Waldorf. Que bom, porque isto representa um avanço da educação em Sergipe!


Publicado no jornal Cinform 27/04/2009 – Caderno Emprego
Publicado no Jornal do Comércio / SE – Editorial abr/2009

terça-feira, 14 de abril de 2009

Empreendedorismo e Educação


No final do século XX a UNESCO encomendou a elaboração de um relatório que apontasse a direção a ser dada para a educação no novo século. Tal relatório, conhecido como "Delors", indicou que os processos pedagógicos deveriam trabalhar a partir de 4 pilares: aprender a aprender, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser.

Neste momento vou me ater exclusivamente a comentar sobre o “aprender a fazer”, pois é aqui que entra o empreendedorismo mais fortemente na educação formal. Infelizmente, nas nossas escolas esse importante pilar é de difícil aplicação, por quê? Porque educar o fazer, implica em trabalhar a vontade de cada um. Assim, a escola tem que dar oportunidade a cada um individualmente de expressar seu querer e as ações decorrentes dele. Neste âmbito, se descobrem talentos ainda não manifestos e se desenvolvem importantes habilidades.

Nosso modelo escolar, influenciado pela educação jesuítica, busca como ideal “educar a todos como se fossem um só” e, consequentemente, temos aí uma pedagogia conformadora, doutrinaria, que valoriza apenas os processos silenciosos e isoladores do pensar, da memorização e da cognição. Em educação, é forte a tentação de reproduzir o mesmo que recebemos, de repetir as aulas de um tempo que não voltará, para alunos que não são os mesmos, em uma sociedade com valores cada vez mais distantes. Em resumo, educar para um futuro que com certeza não virá.

Dito dessa forma, pareço defender novidades e inovações na escola, mas não é isso. Minha posição vem em defesa de uma educação que favoreça o desenvolvimento humano integralmente: eduque-se o pensar, o sentir e o agir harmoniosamente. Do que conheci até hoje, a linha pedagógica mais completa, por assim dizer, é a Pedagogia Waldorf, alemã, cerca de 1000 escolas no mundo, 90 anos de existência e mais de 50 deles no Brasil. Lamentavelmente desconhecida até nas faculdades de pedagogia devido, creio, a sua independência mercadológica. Noutro artigo dedicarei atenção exclusivamente a esse tema. Voltemos ao empreendedorismo.

Num passado próximo, ser empreendedor era sinônimo de ser empresário, ser capitalista, ou até ganancioso. Isso deriva do fato de chamar-se empreendedor, no século XVIII, aos que “compravam por preço certo para vender por preço incerto”, levando o comerciante a assumir riscos e obrigar-se a agregar algum valor ao produto visando convencer o comprador. Hoje, a definição é outra, sabemos que ser empreendedor é uma característica comportamental. É um conjunto de atitudes e hábitos que faz uma pessoa ser empreendedora, e como tal, estas atitudes podem ser adquiridas e desenvolvidas na escola e, uma vez adquiridas permitirão ao empreendedor aplicá-las onde bem entender. Alguns vão efetivamente valer-se desta habilidade para ganhar dinheiro, mas afirmo que será uma minoria. O empreendedor é um visionário que buscar construir seus sonhos, e aí residem seus valores fundamentais – ganhar dinheiro é secundário, é uma conseqüência de sua obra.

Empreendedora exemplar foi Irmã Dulce, que sonhou e dedicou-se a acolher e cuidar de doentes pobres da Bahia, deixando um legado indiscutível de santidade e um dos maiores hospitais públicos do Brasil em pleno funcionamento até hoje, o Hospital Santo Antonio. Sua biografia é marcada por inconformismo e gestos revolucionários como, invadir casas desabitadas para abrigar tuberculosos moradores de rua e iniciar seu hospital dentro do galinheiro do convento com 70 leitos. Quem ler sobre Irmã Dulce encontrará uma vida recheada de ações voltadas para o mesmo fim: construir seu sonho a partir unicamente de sua vontade infinita.

Outro empreendedor emblemático porque realizou uma grande conquista a partir do nada, foi o já falecido Deputado Federal Enéas. Analisem comigo: dispor de meia dúzia de segundos de televisão em horário eleitoral gratuito e tornar-se o deputado federal mais votado da historia de São Paulo e do Brasil com mais de 1,5 milhão de votos é um fenômeno e tanto. Alias, desculpo-me por estar sendo prolixo para falar deste personagem comunicador; deve ser porque meu nome não é Enéas!

Nossas escolas precisam “ensinar” os jovens a sonhar, a ter meta de vida, a exercitar sua visão de longo prazo, a fazer seu plano de negócio e a caminhar na construção desses mesmos sonhos. Nosso vínculo com o futuro é o agir, o futuro é construído por nossas ações. Ora, se minhas ações não podem mudar o passado é porque seu campo de ação não é aí.  Então, sim, no futuro!

Em Sergipe, algumas boas iniciativas empreendedoras acontecem em escolas públicas e particulares. A Junior Achievement, uma associação sem fins lucrativos, centenária, faz um belo trabalho junto a escolas regulares de ensino fundamental e médio. Também, vale à pena conhecer o trabalho desenvolvido nos colégios estaduais Médici - Aracaju, Glorita Portugal – São Cristóvão, e Edélzio Vieira de Melo – Capela. Nestas escolas e mais algumas outras, Empreendedorismo é disciplina obrigatória no ensino médio e os alunos tem oportunidade de aplicar o que aprendem em diversas atividades interdisciplinares, feiras realizadas nas escolas, apresentações artísticas, e até mesmo na Feira de Sergipe que acontece na Atalaia todos os anos em janeiro.

Encerro, enaltecendo os professores de empreendedorismo dos colégios citados como docentes exemplares e verdadeiros amigos de seus jovens alunos. Embora iniciada em 2006, a disciplina Empreendedorismo nestas escolas já apresenta inúmeros casos de sucesso de alunos e ex-alunos no mundo do trabalho e em concursos diversos. Empreendedorismo como disciplina curricular no ensino médio é uma dessas coisas que só Sergipe tem!

    Publicado no jornal Cinform 13/04/2009 – Caderno Emprego