O título
desse artigo foi extraído de palestra homônima proferida no Senac e na UFS,
pelo Prof. Dr. Valdemar Setzer, da Universidade de São Paulo – USP -, durante
sua passagem por Aracaju nos últimos dias. O conteúdo, como há de se esperar,
não traz boas notícias para os habituais frequentadores de redes sociais e
sites de buscas. Inspirado em pesquisas realizadas por cientistas americanos,
especialmente por Nicholas Carr, a narrativa discorre sobre a preguiça mental
(ou emburrecimento, nas palavras do pesquisador), resultante da leitura de
textos na internet.
A partir da
metáfora, do homem primitivo coletor de frutos e mariscos, ou seja,
extrativista de subsistência e, portanto, incapaz de praticar a agricultura ou
a pecuária, o palestrante expõe a situação do jovem contemporâneo, usuário
contumaz da internet. Nesse sentido, como usuário, ele vive de achados
fortuitos e superficiais, sem dominar o ambiente. Quem sabe, um nômade digital
ou um analfabeto versão 2.0?
Tal
superficialidade faz do jovem um ser limitado intelectualmente e dotado de
preguiça mental. Pode parecer exagero essa afirmativa, mas os educadores
percebem a incapacidade de aprofundamento na leitura e a correspondente
ausência de disciplina da vontade, presentes nas salas de aulas atuais. Não por
acaso, Albert Einstein afirmou: “temo o dia em que a tecnologia se sobreponha à
nossa humanidade: o mundo terá apenas uma geração de idiotas”.
A volição
deve ser educada com a mesma intensidade e rigor que a cognição. Uma pessoa que
não desenvolve a popular “força de vontade” pode se tornar vítima de si mesmo.
Um exemplo esclarecedor é comparar a volição a um movimento metabólico do corpo,
como o do intestino. Em seu ritmo normal, o intestino age por sua própria
vontade, geralmente em equilíbrio, ou tolerância, com nossas disponibilidades
de tempo. Contudo, quando vitimado por uma diarreia, impõe sua vontade de forma
unilateral, imperando sobre todas as outras vontades, compromissos ou desejos
humanos, como a afirmar, indelicadamente, sobre quem manda em quem agora.
Comparativamente, essa pode ser a reação de uma pessoa, volitiva e
emocionalmente deseducada, que não consegue manifestar uma posição de
equilíbrio, quando sob forte pressão: descontrolada e rebelde, agindo “fora de
si” para se impor sobre os demais elementos, sejam internos ou externos.
Diferentemente
dos livros, a internet, mesmo em trabalhos de pesquisas, limita a capacidade de
entendimento da leitura. Os anúncios rotativos e a oferta de hipertextos, com
seus vínculos tentadores, desviam da rota lógica da pesquisa e quebram o
entendimento do texto. Dessa maneira, o pesquisador na internet tende a ser um distraído
coletor de manchetes, boiando na superfície do assunto, sem conseguir se
concentrar. Há autores que afirmam que o Google criou a chance de maquiarmos
inteligência, quando não a possuímos.
Outro
agravante prejudicial ao desenvolvimento dos jovens vem do uso exagerado de
redes sociais, como o Facebook ou o Twitter, por afastar do contato “olhos nos
olhos”, essencial para a construção de relações sociais e desenvolvimento do
caráter. Um jovem plugado fica em média mais de oito horas por dia em frente à
telinha de computadores, smartphones, tablets ou tvs. Disso decorre um estado
anestésico mental com dependência psicológica, além de sobrepeso e maior
insegurança existencial. Um verdadeiro caso (ou caos) de saúde pública.
Diante de notícias
que anunciam a venda recorde de tablets nesse último dia das crianças, devemos
refletir sobre quais qualidades estamos cultivando em nossos descendentes e
quais atrofiamos? Quais acessos lhes permitimos e superexposições lhes ofertamos?
Será que daríamos uma emissora de TV para uma criança publicar livremente, em
outras épocas? Que saúde futura terá a criança que passa várias horas por dia, parada
diante de telas e sentada numa carteira escolar sem brincar?
“Bendito,
bendito é aquele que semeia livros, livros a mão cheia e manda o povo pensar; o
livro caindo na alma, é germe que faz a palma, é chuva que faz o mar.” Castro
Alves.
Publicado
no jornal Cinform de 20/10/2014 – Caderno Emprego