segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

2014 – Ano Internacional da Agricultura Familiar



     A Assembleia Geral das Nações Unidas decidiu que em 2014, será celebrado o Ano Internacional da Agricultura Familiar. É, justamente, um reconhecimento à importância da agricultura familiar na segurança alimentar e no combate a pobreza.

     Por certo, nas milhões de unidades agrícolas familiares brasileiras residem pessoas especiais, que conseguem extrair da pequena área de terra o sustento de suas famílias. Há alguns anos, era comum existir agricultores que milagrosamente criaram numerosos filhos e filhas a partir de alguns poucos hectares de terra, inclusive formando-os em escola superior. Hoje, essa situação parece impossível, porque viver da produção artesanal agrícola, com raras exceções, é inviável.

     Uma das razões que inviabilizaram a sustentabilidade do pequeno produtor é a dependência de insumos para a manutenção de sua produção. Compra-se de tudo para um sítio: sementes, defensivos, adubos, embalagens, equipamentos de irrigação, etc. Essa dependência provoca evasão demasiada de recursos para bancos e multinacionais químicas e biotecnológicas. Ou seja, o produtor agrícola é um escravo do sistema econômico internacional, trabalhando forçadamente para empresas que lhes impõem um modelo de manejo inadequado para terras tropicais.

     No Brasil atual, só o agronegócio de grande escala é viável. Todos os demais agentes da agricultura estão travando uma luta perversa pela sobrevivência, especialmente o médio produtor, por ser desassistido de políticas públicas, como ainda o são, de alguma forma, os pequenos.

     Estranhamente, chamamos de agronegócio a atividade de produção em larga escala de commodities, a exemplo da soja e do milho. Porém, são essencialmente atividades de serviços que nada tem a ver com a atividade rural, uma vez que as sementes são transgênicas, a fertilização é química, a manipulação é automatizada, o consumidor é mundialmente indeterminado, os preços são em dólar, o planejamento do negócio se dá em grandes centros econômicos e de pesquisas, e o gerenciamento é informatizado. Assim, o território utilizado é apenas um substrato para a geração de alimentos “plásticos” controlados por satélites, nada convergindo para as populações locais e a cultura rural.  

     Os biomas florestais brasileiros são os mais ricos do planeta em extensão e biodiversidade. Assim, lutar contra as forças da natureza em nossas terras é mais difícil que em outras paragens. Com efeito, toda atividade agrícola é uma intervenção humana contrária às ações da natureza, uma vez que nunca encontraremos uma horta criada espontaneamente.

     Porém, é possível se valer das forças locais de um sítio para minimizar o impacto da atividade rural. É o que assegura a Agricultura Biodinâmica, criada por Rudolf Steiner no início do século XX e hoje, praticada em mais de 50 países, inclusive o Brasil. Os produtos certificados biodinâmicos recebem o selo de identificação internacional DEMETER.

     A Agricultura Biodinâmica tem como consequência natural a renovação do manejo agrícola, o saneamento do meio ambiente e a produção de alimentos condignos ao ser humano. Quer, ainda, devolver à agricultura sua força original criadora e fomentadora cultural e social, perdida no caminho da industrialização, da monocultura e da criação em massa de animais fora do seu ambiente natural. Dessa forma, o agricultor biodinâmico caminha para vencer a concepção materialista imposta à natureza e assim, achar uma relação espiritual – ética, com o solo, plantas, animais e humanos.

     Pode parecer distante esse discurso, mas não é. O maior certificador de produtos orgânicos do Brasil é o IBD – Instituto Biodinâmico, com sede em Botucatu (SP) e, existem diversas publicações e cursos sobre o assunto. Interessante destacar que os custos para a produção agrícola por meio dessa eficiente tecnologia são irrisórios, pois, esta, visa transformar o sítio em uma individualidade agrícola autossuficiente, libertando o produtor do círculo vicioso convencional.

     A Agricultura Biodinâmica pode ser para o agricultor familiar a Árvore da Vida.


       Publicado no Jornal Cinform em 30/12/2013 - Caderno Emprego

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Atividade-meio e atividade-fim: nem tudo são rosas


Por diversas razões somos tentados a dividir as rotinas de trabalho de uma organização com base naquilo que é mais vinculado ao propósito maior da empresa. Dessa divisão resulta definir o que seria a área-fim da atividade econômica, restando às demais rotinas de apoio a classificação em área-meio.

     Tal classificação envolve conceitos de natureza legal, uma vez que a norma trabalhista brasileira, escrita na década de 40 - antes, portanto, do processo de industrialização do país, não permite terceirização de atividades-fim. Essa inflexibilidade prejudica o desenvolvimento da empresa nacional, inclusive a pública, uma vez que processos industriais e de serviços poderiam ser executados com maior produtividade, menores custos e com ganhos de escala por empresas altamente especializadas, além de reconhecidamente acreditadas.

     Será a manutenção de aeronaves, atividade-fim de uma empresa aérea? Deve a transportadora fabricar empilhadeiras ou caminhões? Seria a montadora de automóveis obrigada a fabricar todas as peças de um carro? Difícil responder com segurança no emaranhado legal tupiniquim. Recentemente, o Tribunal Superior do Trabalho sentenciou que a CELG, distribuidora de energia elétrica de Goiás, não poderia terceirizar a construção, reforma e manutenção da rede e subestações. Assim, podemos extrapolar a mesma lógica para que os jornais fabriquem o próprio papel e que a Transpetro, subsidiária da Petrobras, só utilize navios próprios, nunca fretados. É realmente cinzenta a região que define o que é atividade-fim do que é atividade-meio na complexa Economia atual.

     Renomados juristas entendem que “a atividade-meio diz respeito àquela tão-somente secundária, acessória, quanto aos fins do empreendimento. Se a cessação de certa atividade não interfere para a consecução de certo produto, objeto dos fins da empresa, certamente trata-se de atividade-meio”. Definição ampla demais, pois não é possível uma escola funcionar sem a frequente higienização dos banheiros. Embora, os agentes de limpeza sejam típicos terceirizados.

     Contudo, não vamos propor soluções para esse tema, de grandeza inversamente proporcional ao espaço desse texto. Voltemos nosso olhar para o que acontece dentro das empresas, em suas rotinas administrativas e produtivas, onde, infelizmente, é comum a discriminação de trabalhadores do próprio quadro de funcionários da chamada atividade-meio, pelos que atuam na atividade-fim.

     É relativamente comum o “nariz empinado” daqueles que exercem atividades finalísticas, por estarem, digamos, próximos do propósito mais imediato da empresa. Porém, toda sobrecarga de trabalho desses implica em imediato incremento da atividade de todos. Logo, o motorista vai trabalhar mais, assim como o porteiro ou o auxiliar contábil. Não há, portanto, possibilidade de trabalho exclusivo de um único setor nas organizações. Dessa forma, a distinção entre a importância de um determinado posto ou profissional no organograma será ditado pela remuneração ofertada pelo mercado de trabalho, e não pela relação entre as atribuições do cargo e a missão da empresa. É o que nos retrata o pequeno conto abaixo:

     "Era uma vez uma rosa muito bonita, a mais linda do jardim. Mas começou a perceber que as pessoas somente a observavam de longe. Acabou se dando conta de que, ao seu lado, sempre havia um sapo e, por essa razão, ninguém se aproximava.

     Irritada com a descoberta, ordenou ao sapo que fosse embora. O sapo, humildemente, disse:

     - Está bem, se é o que deseja.

     Algum tempo depois, o sapo passou por onde estava a rosa e se surpreendeu ao vê-la acabada, sem folhas nem pétalas. Penalizado, disse:

     - Que coisa horrível, o que aconteceu com você?


     A rosa respondeu:

     - As formigas começaram a me atacar dia após dia, e agora nunca voltarei a ser bela como era antes.

     O sapo respondeu:

     - Quando eu estava por aqui, comia todas as formigas que se aproximavam de ti. Por isso é que eras a rosa mais bonita do jardim”.
  

                                                     .
Publicado no Jornal Cinform em 16/12/2013 - Caderno Emprego



segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Só faço previsão após os noventa minutos



     Uma das grandes inquietações humanas é prever o futuro. Àqueles que se dizem leitores do futuro, atribuímos adjetivos caros aos mortais, como por exemplo, mago, sobrenatural, paranormal, etc. Fazer previsões sobre o amanhã não é mesmo tarefa fácil. Daí o título deste texto que nos remete a uma resposta “previsível” de jogador de futebol abordado pela imprensa antes do jogo.

     De fato, erramos demais as previsões. Pesquisas demonstram que, em média, apenas 20% das previsões são certeiras e não estão associadas à área de domínio do pretenso visionário. Assim, economistas não acertam eventos futuros na economia com maior chance que pessoas leigas. Há um debate célebre com o falecido economista Mário Henrique Simonsen, ex-ministro do regime militar brasileiro, quando questionado sobre as previsões erradas na economia, disse: “a economia não comporta previsões”. E indagou, desafiador: “Alguém aqui pode lembrar alguma previsão de um economista que tenha dado certo?” Na hora, um debatedor citou o caso do economista marxista húngaro Jenö Varga, que previu a crise da Bolsa de New York em 1929. A reação de Simonsen surpreendeu a todos: “Varga era tão ruim que acertou”.

     Uma das causas de errarmos tanto nas previsões, é que partimos de uma compreensão equivocada do presente para especular sobre o futuro. Disso resulta que 25% dos americanos se consideram parte do 1% que possui capacidade de liderança ou, ainda, 90% deles, se avaliam motorista acima da média. Distorções, essas, capazes de ruborizar um bom discípulo socrático, seguidor do “sei que nada sei”. 

     Com efeito, nosso fracasso maior sobre previsões advém de uma limitação instrumental do nosso cérebro que está totalmente a serviço do nosso passado, por meio da memória e da aprendizagem já executada, fontes do nosso pensar. Por certo, pensar o futuro com a mesma facilidade que o passado, é o sonho de todo investidor, toda seguradora ou apostador de loterias. Mas, como isso nos é impossível, só resta uma maravilhosa solução: não adivinhar passivamente qual será o porvir e sim, faze-lo acontecer por meio de nossas ações, como fazem os empreendedores. Dessa forma, concluímos que o futuro se constrói a partir de nossa vontade e das nossas ações.

     Podemos afirmar que o astrônomo e matemático francês Laplace (séc. XIX) trouxe para a humanidade a ilusão da previsibilidade plena, quando demonstrou o funcionamento do universo segundo leis matemáticas. Assim, se todo o cosmo funciona como um relógio, influenciando a natureza terrestre, então, o futuro seria conhecido através dessas mesmas leis, ou seja, uma mera questão de computação, que denominou “intelecto”. E reforça: “para um intelecto como esse, nada seria incerto e o futuro, assim como o passado, estaria presente diante dos seus olhos”.

     Saber a data que os planetas voltarão a se alinhar ou o horário exato das marés é fruto da leitura de um sistema simples que pode ser equacionado com um M.M.C. – mínimo múltiplo comum, do ensino fundamental. O mesmo não se aplica a sistemas complexos como a economia de uma nação que depende de fatores externos, absolutamente fora do controle de qualquer dos seus agentes. Aliás, por sistema, devemos entender que nele, nenhum elemento pode possuir controle sobre o todo.

     O saudoso Millôr Fernandes, com suas frases geniais ensinou que “o passado é o futuro usado”. E quem usa o futuro? Certamente, os empreendedores, agentes de transformações sociais, culturais e econômicas, movidos pelo inconformismo típico dos que interveem nas estruturas vigentes pela via da inovação e, muitas vezes, acelerados pelos momentos de crise, a abrir os caminhos por onde a humanidade passará.

     Portanto, com a chegada do fim do ano, é hora de fazer previsões que engordam o ibope dos programas de TV. E, se não encontramos os profetas facilmente esses dias, é porque estão calibrando suas bolas de cristal, para dar conta do volume de serviços que vem por ai.



  Publicado no Jornal Cinform em 02/12/2013 - Caderno Emprego