segunda-feira, 19 de agosto de 2013

As aventuras de feissibuq no planeta azul


     Durante quarenta anos, as Farc – Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia -, um grupo insurgente marxista-leninista colombiano, vinha se dedicando ao terrorismo, tráfico de drogas e armas, além de sequestros. Pontes eram explodidas, aviões eram derrubados, cidades eram aterrorizadas.

     Entre 1999 e 2007, as Farc controlavam 40% do País. Os sequestros haviam se tornado tão frequentes, que no início de 2008, setecentas pessoas eram mantidas em cativeiro, incluindo a candidata presidencial, Íngrid Betancourt, sequestrada durante a campanha de 2002.

     Todos, sem exceção, tinham receio de se opor às Farc, pois os que assim fizeram, desapareceram por sequestro ou morte. O que se via era uma grande insatisfação nas pessoas, de forma contida ou dissimulada pelo medo. 

     Mas, subitamente, e aparentemente do nada, em 5 de fevereiro de 2008, em cidades do mundo inteiro, milhões de pessoas acorreram às ruas, protestando contra os rebeldes e exigindo a libertação dos reféns.

     Tal mobilização atingiu 200 cidades em 40 países, envolvendo 12 milhões de pessoas nas ruas, sendo 1,5 milhão só em Bogotá. Os protestos geraram tamanha repercussão mundial que desmilitarizou as Farc, ao ver quantas pessoas no mundo eram contra ela.

     Esse fenômeno de mobilização social nasceu do inconformismo de uma pessoa, Oscar Morales, criador do perfil “Um Milhão de Vozes” no Facebook, usado para divulgar e convidar seguidores para a seguinte causa, em letras maiúsculas mesmo: “CHEGA DE SEQUESTROS, CHEGA DE MENTIRAS, CHEGA DE MORTES, CHEGA DE FARC”.

     Apenas um mês depois de criado o perfil no facebook, toda essa mobilização se realizou. Tudo que Morales precisou para destruir as Farc foi de um computador, uma ideia na cabeça, a internet e a indignação. Esse é o novo mundo, onde os protagonistas são agentes “vitaminados” da microfísica do poder.

     Com a chamada “Primavera Árabe”, não foi diferente. As redes sociais foram os principais veículos de mobilização popular e de divulgação da realidade dos países controlados por mãos de ferros de ditadores. Durante os protestos no Cairo (Egito) que derrubaram o presidente Hosni Mubarak, um ativista sintetizou isso muito bem numa mensagem no twitter: “Usamos o Facebook para marcar os protestos, o twitter para coordenar e o youtube para informar ao mundo”.

     É claro que esses movimentos cresceram por causa da indignação popular. Ninguém aderiu por modismo ou porque recebeu um SMS convidando para uma manifestação pública. Em paralelo, não se pode negar que o domínio das tecnologias da informação e comunicação - TICs - exige uma infraestrutura considerável de antenas e satélites, acrescido de capacitação técnica. E como se implantou isso em países fechados?

     Algumas tecnologias foram utilizadas longe de seus propósitos originais. O Bluetooth foi uma tecnologia inventada para que as pessoas pudessem conversar enquanto dirigiam – nenhum dos seus criadores esperava que essa rede ponto a ponto seria usada para contornar um regime opressivo. Apesar de o Departamento de Estado norte-americano investir muito no que a secretária de Estado Clinton denominou de “política do século XXI”, que propôs formas inovadoras de diplomacia.

     Nesse contexto, quase todos os grandes líderes do mundo das TICs visitaram o Iraque para apresentar seu ponto de vista e propor soluções que mudassem a realidade do País, recém-invadido pelos americanos.

     Esses fatos foram extraídos do livro Abundância – O Futuro é Melhor do que Você Imagina -, de Diamandis e Kotler. Infelizmente, o futuro pode não ser tão bom como eles imaginam, pois nem tudo são flores na vida de feissibuq, já que a mesma utilização emancipadora proporcionada pelas TICs também serve para grupos radicais se articularem, prometendo ou promovendo atentados terroristas.

     Cena que assistimos hoje, com a retirada do corpo diplomático americano e inglês do Oriente Médio, motivada por interceptações de diálogos de extremistas na internet do planeta azul.
  
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Publicado no Jornal Cinform em 19/08/2013 - Caderno Emprego

Publicado na revista TI&N em 08/2013 – nº 014





segunda-feira, 5 de agosto de 2013

O retorno de Saturno


     Passei vinte e nove meses num navio
E vinte e nove dias na prisão
E aos vinte e nove, com o retorno de Saturno
Decidi começar a viver.

Com esses versos esotéricos, a banda Legião Urbana revelou uma grande sabedoria - o retorno de Saturno à mesma posição no zodíaco ocorre a cada vinte e nove anos - e fez oposição a outra famosa melodia, da década de 1970, que dizia: “Não confie em ninguém com mais de trinta anos”. Mas o essas idades têm de importante?

     Estudos biográficos humanos ensinam que, até cerca dos trinta anos, é possível a revelação de talentos natos. Isto é, após essa idade, os dons naturais não mais surtirão efeitos, caso não tenham sido trabalhados antes.

     Pessoas que aprenderam sozinhas a tocar violão, dançar, jogar futebol, pintar quadros ou a praticar outras artes de forma espontânea e vocacionada, certamente, fizeram quando jovens e pegaram carona no talento natural que possuíam. Aos que já passaram dos trinta anos, resta-lhes a chance de realizar a mesma coisa, porém, pelo caminho do esforço e perseverança, semelhante ao jovem que necessita aprender algo para o qual não possui nenhuma afinidade nata.

     Antes dos trinta anos, as pessoas são mais audaciosas e desconhecem impossibilidades convencionais, como nos exemplos apresentados a seguir, extraídos do livro Abundância – O Futuro é Melhor do que Você Imagina -, de P. Diamandis e S. Kotler.

     No início da década de 1960, foi lançado o programa espacial Apollo, com pouquíssima tecnologia disponível. Quase tudo teve de ser inventado em paralelo aos lançamentos dos foguetes. Se credita o sucesso do programa ao fato de que os engenheiros responsáveis eram muito jovens para saber que estavam tentando o impossível. Os engenheiros que nos levaram à Lua tinham no máximo trinta anos.

     Alguns anos mais tarde, outros jovens promoveram uma revolução no campo da informática ao desenvolver os microcomputadores e os sistemas operacionais amigáveis, popularizando o acesso ao mundo digital e as aplicações, até então, inacessível aos mortais e às pequenas empresas.

     A partir da década de 1990, jovens inovadores promovem a revolução “pontocom”. A internet ganha uma linguagem própria, interativa e democrática, que disponibiliza a todos o status de autor, tornando a comunicação difusa e igualitária a todos, dentro da rede. É a chamada web 2.0, “terra” das redes sociais e dos sítios de livre publicação, como o YouTube ou os blogs.

     Em 2004, Jared Cohen, 24 anos, universitário americano, estava disposto a conhecer o Irã e estabelecer amizade com jovens locais, em plena época de conflito com os Estados Unidos. Conseguiu, com dificuldade óbvia, um visto de entrada e para lá viajou. É uma longa e curiosa história, mas suficiente para fazer, desse corajoso viajante, um dos homens mais conhecedores de redes sociais do mundo, sendo hoje, diretor de Ideias da Google.

      Ele fez muitos amigos, a maioria jovens. Na época, o Irã possuía dois terços da população com menos de trinta anos, o que criava uma barreira digital para os mais idosos, que não tinham domínio algum sobre as censuradas mídias digitais.

     Um interessante episódio acontece quando Cohen encontra com meia dúzia de jovens em uma esquina, encostados na parede, usando explicitamente os celulares.

     Perguntou a um rapaz o que estava acontecendo e foi informado que todo mundo vinha usar o Bluetooth para acessar a internet.

     “Vocês não têm medo de serem presos?”, perguntou Cohen.

      O rapaz fez um sinal de não com a cabeça.

     “Ninguém com mais de trinta anos sabe o que é Bluetooth”.  

     Porém, nem tudo é vantagem para os jovens, pois, mesmo quando, aos mais talentosos, a vida dá presentes que os transformam em grandes técnicos ou artistas, ainda lhes faltam saturnos.

      Só dos trinta em diante, é possível viver a recompensa da maturidade. Maturidade essa que permitiu, a partir dessa idade, a presença do Cristo, igualmente Homem, entre nós.



         Publicado no jornal Cinform em 05/08/2013 - Caderno Emprego