segunda-feira, 20 de junho de 2011

Robô pra quê?



     Nos anos 60, a série televisiva ‘Os Jetsons’ fazia grande sucesso por especular sobre o futuro. As cenas eram simplesmente delirantes mesmo quando analisamos hoje, após 50 anos, o que se concretizou e o que está por vir, ainda desconhecido aos nossos olhos. Aparentemente, existem influências desse desenho animado visionário na arquitetura de alguns prédios e torres construídas no mundo, como o aeroporto de Los Angeles e o obelisco de Seattle, ambos nos Estados Unidos.


Também são designs dignos dos Jetsons o berço DoDo, e até – pasme! - a torneira Smartfaucet com tela de LCD para que se possa ler os e-mails enquanto, muito tradicionalmente, escova os dentes.  Porém, se no design e na arquitetura existem produtos em pleno funcionamento, o mesmo não se pode dizer dos veículos urbanos e dos robôs, auxiliares muito competentes nas tarefas domésticas, a exemplo da governanta eletrônica Rosie.


Chegamos ao terceiro milênio com índices acanhados de automação e robótica. A indústria, carro-chefe da utilização de robôs nas linhas de montagens, não se mostra com o apetite imaginado para o assunto por quê? Quando analisamos os robôs industriais, verificamos que são compostos por três eixos tecnológicos: mecânica, eletrônica e software.


O primeiro eixo, ou seja, a mecânica é uma ciência bastante dominada e já mostra sinais de esgotamento tecnológico em alguns de seus pilares, a exemplo de elementos de máquinas e conversões de movimentos, e alta vitalidade na pesquisa de novos materiais e lubrificação. Mas, certamente, por ser o mais antigo dos três eixos tecnológicos, é também o que mais dominamos.


O eixo da eletrônica ainda apresenta inovações diárias, embora já atenda a contento nossas necessidades de automação por meio dos mais diversos tipos de sensores e escâneres disponíveis. Por último, o eixo tecnológico do software, o mais novo dos três, se apresenta como um desafio quase intransponível para o nível científico atual.


Esse bloqueio se deve a dificuldade de explicitar na forma de códigos, movimentos combinados que fazemos com muita naturalidade em nossos corpos, mas para se comandar em uma máquina torna-se extremamente difícil. Essa dificuldade faz com que os robôs industriais usuais sejam limitados a três articulações, também chamadas graus de liberdade: pinça, punho e cotovelo. Assim, por analogia, corresponde a um braço humano dotado de polegar mais um dedo, munheca e cotovelo. E só. Porém, suficiente para exigir em sua animação trabalho técnico especializado de programação.


Matematicamente, os três graus de liberdade do robô industrial oferecem as combinações de uma matriz de três linhas e três colunas. Em comparação a mão humana, vemos que esta possui 27 graus de liberdade, o que a torna inacessível para a lógica de programação disponível. Mesmo assim, esse limitado dispositivo industrial é suficientemente hábil para soldar, apertar parafusos, preencher embalagens e engradados com mais rapidez e precisão que nós homens poderíamos fazer, mas tudo tem um custo, pois, para realizar esta proeza, o robô exige um ambiente totalmente controlado, livre de adversidades e surpresas, o que provoca o engessamento de toda a linha industrial.


Diante desses fatos, constatamos que o robô idealizado para a indústria representa a culminância do modelo fordista, focado na eficiência e na massificação dos produtos, inadequado, pois, para a nova indústria que busca flexibilizar a capacidade produtiva ou até desmaterializar seus produtos. Nesse contexto, o robô parece ser uma invenção tardia. Porém, muita novidade está por vir na automação residencial, comercial e industrial. A maior revolução anunciada pela robótica será a supressão do limitante software, a ser substituído pelo pensar humano por meio da leitura direta de ondas cerebrais.


Pesquisas nesse campo se encontram em estágios bem evoluídos, particularmente, as realizadas pelo médico brasileiro, Miguel Nicolelis, primeiro conterrâneo candidato ao prêmio Nobel de medicina por seus estudos de neurociências na interface homem-máquina. Promete, inclusive, o Dr. Nicolelis desenvolver um exoesqueleto que vestido por uma pessoa com severa deficiência motora dará possibilidade, a mesma, para realização do chute inaugural na abertura da Copa de 2014, no Brasil, a partir de seu comando mental.


Vamos reinventar o robô. Vamos livrá-lo da imagem humanóide, romântica e inútil. Eles podem executar atividades às quais não se deve expor um ser humano devido ao risco e às condições adversas à vida. Os protótipos atuais não fazem sucesso nem em novelas das sete. Contudo, aplicada na educação, a robótica faz grande sucesso entre jovens, ávidos por contextualizar a aprendizagem e exercitar nos seus projetos o talento e a criatividade que só eles tem. E tudo isso num mundo real que nem é o dos Jetsons  nem  o dos Flintstones.     



Publicado no jornal Cinform 20/06/2011 – Caderno Emprego
Publicado na revista Tecnologia da Informação & Negócios nº 01/2011

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Degradar para produzir: a ética caduca



     Uma grande e bem vinda novidade seria encontrar a fórmula definitiva de conciliar desenvolvimento econômico com respeito ambiental e social. Muitos discursam nesta direção, embora a veemente retórica não corresponda ao diminuto passo na direção da sustentabilidade.


A palavra ‘sustentabilidade’ é um dos verbetes mais frequentes nos principais livros técnicos da literatura de negócios. Equipara-se a ‘negociação’, ‘marketing’, ‘mercado de capitais’ e outras palavras-chave do vocabulário da administração de empresas.


Executivos de todo o mundo se debruçam sobre como transformar sua organização tradicional em uma empresa sustentável. Esse é o desafio de maior evidência nas agendas econômicas, sociais e governamentais desde o final do século XX. O difícil é acreditar que com a ética prevalente nos nossos dias possamos achar soluções para esse desafio, ainda que atuemos com  ética. Por quê?


Em princípio, nenhuma matéria-prima tem preço em si. Toda ela se origina em Deus, sendo, portanto, dada pela natureza. Assim, ninguém paga R$ 0,10 sequer por uma pérola magnífica que se encontra nas profundezas do oceano, caso se tenha que ir buscá-la. Da mesma forma, não compramos terrenos na lua nem a R$ 0,01 por hectare.


O preço crescente dos produtos é fixado pelos custos de exploração, beneficiamento, produção, logística, comercial, transporte, tecnologia, processamento, marketing, recursos humanos, desperdícios, ociosidade, sazonalidade e várias leis de mercado. São esses processos da cadeia de produção que agregam valor às gratuitas matérias-primas.


Talvez, pela ausência de um preço original, mantemos uma relação desrespeitosa com a natureza na exploração dos seus recursos. Com base  neste pressuposto, podemos afirmar que maior será o proveito e controle, quanto maior for a degradação imposta ao nosso objeto explorado em qualquer reino da natureza, características de uma relação direta entre o lucro e a degradação.


Quando trabalhamos com o reino mineral, buscamos selecionar suas substâncias mais nobres, isto é, aquelas mais organizadas em suas estruturas cristalinas, a exemplo de cristais e metais, verdadeiros representantes do reino. Nessa atividade mineradora, após processar a separação das partes cobiçadas, ficam no local apenas substâncias amorfas e descristalizadas, degradadas representantes dos minerais.


Nas intervenções que praticamos no reino vegetal somos igualmente agressivos. Eliminamos as árvores, maiores representantes deste reino e  únicos seres capazes de unir as substâncias telúricas da rocha-mãe através de suas profundas raízes, às mais sutis substâncias cósmicas da atmosfera, por meio de sua copa aérea. Infelizmente, substituímos as árvores por gramíneas e cereais, obviamente, de pequenos portes, incapazes de cumprir esse mesmo papel.


Além disso, nos utilizamos abusivamente de sais químicos na adubação do solo numa clara tentativa de mineralizar e, por consequência, aproximar a planta a um reino inferior ao vegetal. Com os animais não é diferente. Costumamos submetê-los a confinamentos cruéis retirando toda sua mobilidade. Triste exemplo é o tratamento dado às galinhas de postura criadas em gaiolas minúsculas, quase imóveis, semelhantes a plantas ornamentais cultivadas em vasos. Deste modo, eliminar a mobilidade de um animal é atentar contra a sua própria natureza mais elementar. Isso porque quando um animal está vivo e desprovido de movimento, dizemos que ele possui vida vegetativa. Eis uma bela metáfora para ilustrar a degradação imposta a este reino, tratando-o como se vegetal fosse.


Por fim, o homem. Aqui, o especificamos como um reino à parte devido a sua particular natureza anímico-espiritual que o distancia dos demais animais. A maior distinção entre humanos e animais está na existência da individualidade presente, desculpem a redundância, unicamente em cada um. Já com os animais (silvestres), a individualidade é própria da espécie, portanto, coletiva, e não de cada ser isolado, obrigando-os a comportamentos iguais em todos os indivíduos.


Neste sentido, quando tratamos homens e mulheres em nossos sistemas de produção, a exemplo do escolar, costumamos impor a todos os indivíduos de uma mesma classe, um comportamento de manada, no qual todos devem responder, vestir, consumir, pensar, agir e sentir igualmente. Está nos princípios da escola brasileira o lema “ensinar a todos como se fossem um só”.


Assim, nessa coletivização, atentamos contra o desenvolvimento do livre-arbítrio ao inibirmos a manifestação e a conseqüente educação da vontade e dos sentimentos humanos. Concluímos, reafirmando que por mais presente que se faça no discurso, a sustentabilidade só será uma realidade quando revermos a nossa própria ética, como visto, incompatível com uma digna convivência humana na Terra.



   

Publicado no jornal Cinform 06/06/2011 – Caderno Emprego
Publicado na revista Tecnologia da Informação & Negócios nº 05/2011