segunda-feira, 27 de setembro de 2010

A resposta está em suas mãos

 

Costumo dizer que possuímos maior facilidade de responder às nossas questões por meio de uma visão bipolar que de uma visão tridimensional. Tal forma de ler o mundo nos compromete a uma melhor compreensão devido à insuficiência de dados. Lamentavelmente, o homem costuma degradar para facilitar o que pretende controlar ou produzir, numa relação extremamente danosa para o equilíbrio da natureza e seus sistemas ecológicos. Essa degradação nos leva a descristalizar o reino mineral, de onde extraímos suas riquezas, abandonando substâncias amorfas. No reino vegetal adicionamos às plantas sais minerais, fertilizantes ou defensivos, talvez numa tentativa de mineralizar e, portanto, degradar os vegetais. Com os animais, tendemos, cada vez mais, ao confinamento abusivo, no qual há severas restrições à mobilidade. Mais uma vez, degradamos, agora com a aplicação de uma vida vegetativa ao reino animal. E, finalmente, quando avaliamos as práticas da condução do ser humano, vemos insistentemente, ações de coletivização contrárias ao desenvolvimento do livre arbítrio, objeto maior de nossa aventura humana. A negação da individualidade nos leva a sermos vistos como uma espécie dotada de comportamentos padrões massificados, e não como indivíduos únicos.     


A compreensão de um universo dotado de dois pólos é uma imagem simplista da verdadeira realidade. Luz ou escuridão, mercado ou Estado, dentro ou fora, criacionista ou evolucionista, simpatia ou antipatia, sujeito ou objeto, atração ou repulsa, vivo ou morto, dentre outros, é uma classificação pobre e insuficiente para a complexidade do nosso universo.


A chave inicial para ampliar a nossa compreensão do mundo está na tridimensionalidade das coisas, e não na bidimensionalidade. Desde quando nossos mais remotos antepassados começaram a observar as estrelas que notaram a tridimensionalidade das coisas presentes no mundo. A partir dos astros perceberam o tempo cronológico dividido em passado, presente e futuro. Também aprenderam a se deslocar no espaço físico, coincidentemente, dotado das três dimensões: altura, largura e profundidade.


Nós, seres humanos, somos dotados de instrumentos naturais para a leitura tridimensional do que observamos: o pensar, o sentir e o agir. Esses instrumentos se aplicam as três dimensões a seguir.


O pensar nos relaciona ao passado vivido e já registrado em nosso cérebro. Por isso, temos muito mais facilidade em dizer quais foram os últimos mil resultados de loterias já realizadas que apenas um único resultado futuro. No espaço tridimensional temos o pensar associado à profundidade.


Já o sentir, isto é, o emocional humano, é nosso instrumento de leitura do presente, do aqui e agora. É o sistema responsável por nos centrar no que fazemos e pensamos. Em resumo, é a sede de nossas atitudes e da nossa convivência social. No espaço tridimensional o sentir relaciona-se à largura, ou seja, à horizontalidade.


Assim, obviamente, o agir é o nosso instrumento do futuro. Através de nossas ações fazemos o futuro acontecer. É o elemento transformador. As mudanças resultantes de nossas ações são sempre posteriores a elas. Por isso, só podemos mudar o futuro e jamais o passado. Dentre as três dimensões espaciais, associamos o agir ao erguer, isto é, à verticalidade.


Para aplicarmos a tridimensionalidade nos exemplos anteriormente citados veremos: que entre a luz e a escuridão encontram-se todas as cores. Que, além de mercado e Estado encontramos o terceiro setor. Veremos ainda que a borda encontra-se tanto dentro quanto fora de uma figura geométrica. Que antropósofos formam uma terceira via entre criacionistas e evolucionistas. Que a empatia supera a simples simpatia ou antipatia. Que entre o objeto e o sujeito está o conhecimento, ou não haveria o sujeito. Que além da atração e repulsa estão todas as órbitas. Que para vivo ou morto, ops....prefiro que leiam abaixo.


No livro Artistas do invisível, de Allan Kaplan, há uma linda história, originada em uma vila de Botsuana, a respeito de alguns jovens que queriam desafiar a sabedoria do ancião da aldeia. O líder desses jovens pegou um passarinho, apertou-o com firmeza para escondê-lo na mão e foi ter com o ancião, levando o seguinte desafio: “Você, que tanto sabe, diga-nos se esse pássaro está vivo ou morto”. A ideia era que, se o ancião respondesse que o pássaro estava morto, o jovem o soltaria, para provar-lhe que estava errado. E, se o ancião respondesse que o pássaro estava vivo, o jovem o esmagaria na mão, para provar-lhe que estava errado. Enfim, não havia jeito de o ancião vencer a prova. Diante do desafio, o velho homem olhou bem nos olhos do jovem e disse, com toda segurança: “A resposta está em suas mãos”.





Publicado no jornal Cinform 27/09/2010 – Caderno Emprego

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Gestão e pedagogia: Princípios comuns

 

Guardo, com muito zelo, um exemplar da revista Informática Exame, de março de 1996. Esse querido exemplar me traz a perfeita noção do quanto nossa sociedade se transformou em tão pouco tempo. Lá está uma chamada para uma edição especial sobre tecnologia da informação com o seguinte título: “entre no mundo da informação sem limites”, com promessas de apresentar “a internet e o boom do comércio eletrônico”. Acontece que no anúncio consta um número de telefone à disposição dos promissores anunciantes, mas não há email ou endereço de internet disponível porque simplesmente, em 1996, não existia internet no Brasil, exceto algumas ilhas da rede. Nesta mesma revista, em outra página, tem um cupom para “acesso direto” aos anunciantes, via Correios, sem necessidade de selar. Encontro, ainda, uma propaganda de um computador Pentium 100, em imperdível promoção por R$ 4.200,00, cerca de R$ 8.000,00, hoje, se corrigido pelo dólar, ou seja, dez vezes o preço de um PC atual de capacidade muito superior.


Assim era o mundo em 1996, ano da promulgação da atual LDB – Leis de Diretrizes e Bases- que regulamenta todo o sistema educacional brasileiro. Embora seja uma Lei moderna, não foi desenvolvida para o contexto atual, o mundo da EaD - educação a distância, das redes sociais, do lap top para cada criança, das lan houses cidadãs, do ENEM, do ENADE, das cotas raciais (sic), dentre outras coisas.


Diante de uma transformação social tão veloz, há de se supor que, assim como muitos jovens de hoje são completamente incapazes de imaginar o mundo sem celular e sem internet, também, nos é impossível saber quais novas profissões surgirão em muito pouco tempo, oportunizando trabalho, inovação, e até uma total dependência tecnológica que não nos  faz a menor falta hoje, mas será indispensável em pouco tempo.


Paralelamente, existem coisas que não mudam, resistindo ao tempo através da sistemática e pobre polarização de valores. Algo como assim ou assado, luz ou escuridão, mercado ou Estado, dentro ou fora. Creio que tal estreiteza de visão está imbricada de pseudo-ideologia da dialética marxista, na qual é necessário se opor tecnicamente, para criar sustentação ao discurso, ainda que distorcido. Situação em que, uma frase apenas, isolada do contexto é usada para desqualificar uma palestra ou uma tese. É uma forma simplista de “vender” a realidade.


Como dizem os antigos, desde que Adão era cadete, isto é, desde quando nossos mais remotos antepassados começaram a observar as estrelas, e que perceberam a tridimensionalidade das coisas presentes no mundo. A partir dos astros, percebemos o tempo cronológico dividido em passado, presente e futuro. Também aprendemos com o céu a nos deslocar no espaço físico terrestre, coincidentemente, em três dimensões: altura, largura e profundidade.


Creio que a tridimensionalidade nos enriquece a compreensão do mundo que vivemos. Desta forma, se imaginamos um circulo, podemos ver que o seu centro pertence a dentro e a fora simultaneamente, igualmente a sua borda.  O mesmo acontece com os modelos de mercado e Estado que desconsideram a existência do terceiro setor, notadamente quando afirmamos que este é não-governamental e sem fins lucrativos. Só dizemos o que ele não é, pois falta-nos a tridimensionalidade natural para entendermos o mundo. Entre os pólos existe o limiar assim, como entre a luz e a escuridão estão todas as cores.


Penso que perguntas recorrentes do tipo “aluno ou cliente?” merecem respostas mais complexas e menos ideologizadas. Todo aluno deve ser tratado como cliente até que se comece um verdadeiro trabalho pedagógico, isto é, até por o pé na sala de aula. A partir daí passa a ser aluno. A relação da escola com o aluno deve ser profunda, pois até o destino deste está sendo definido. Portanto uma relação de profundidade, largura e altura superior à de uma empresa com seus clientes.


Igualmente, quando perguntado se a escola é uma empresa? Respondo que sim. A escola é uma empresa, seja do ponto de vista institucional, seja pelos compromissos orçamentários e financeiros que possui, ou ainda, pela desafiante sobrevivência mercadológica. Mas, acima de tudo, é uma empresa, por ter que ser sustentável para honrar seus compromissos econômicos e educacionais. Isso vale inclusive para a escola pública que tem que apresentar resultados de seu trabalho pedagógico maximizando seus recursos orçamentários.  


Devemos fugir da superficialidade na observação da realidade. Pedagogia e gestão são frutos de uma mesma ciência e, portanto, não podem divergir em seus princípios mais básicos. Tridimensionalmente, devemos educar o pensar, o agir e o sentir na pedagogia. Analogicamente, os gestores necessitam de conhecimentos, habilidades e atitudes, ou seja, competência de suas equipes. Todos os grandes autores afirmam ser a educação casada com o trabalho.





Publicado no jornal Cinform 13/09/2010 – Caderno Emprego
Publicado no Jornal do Comércio / SE – Editorial set/2010