segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Dinheiro traz felicidade?




A incômoda pergunta “dinheiro traz felicidade?” foi a questão norteadora de uma pesquisa científica realizada pela Universidade da Columbia Britânica, no Canadá e pela Harvard Business School, nos Estados Unidos. No primeiro grupo investigado, uma equipe de pesquisadores aplicou um teste numa amostra de 630 pessoas para conhecer seu perfil econômico, hábitos de consumo e seus rendimentos, além, obviamente, os níveis de felicidade que reportavam. Para o segundo grupo pesquisado, formado por 16 funcionários de uma firma em Boston, foram distribuídos bônus entre 3 e 8 mil dólares que tiveram sua destinação acompanhada e o decorrente impacto na felicidade dos abonados. Finalmente, um terceiro grupo composto de voluntários que receberam cerca de 20 dólares para gastar até determinada hora enquanto eram monitorados sistematicamente.

Definitivamente, a resposta a essa pergunta é: “Sim! Dinheiro traz felicidade. Porém...”. Porém, isso só acontece de forma duradoura e evidente quando o usamos a fim de comprar coisas para os outros e não para nós mesmos. “Gastar dinheiro com os outros pode representar um caminho efetivo para a felicidade”, afirmou Elizabeth Dunn, chefe da equipe de pesquisa.

Se olharmos bem para o funcionamento do sistema econômico veremos que há, paralelamente ao movimento financeiro visível, um grande ambiente de caráter afetivo ou emocional recheado de subjetividades e valores humanos. O crédito é uma ação econômica fundamental à saúde e sobrevivência dos mercados. E ele só acontece em um ambiente honesto quando confiamos em quem nos deverá, independentemente das garantias porventura exigidas. Ofertar crédito é acreditar, confiar e viabilizar o sonho do outro, ou seja, dar crédito é comprometer-se com a idéia do outro. Quantas emoções se fazem presentes nas transações creditícias?

Outro aspecto muito interessante está vinculado à regra geral de sobrevivência dos agentes econômicos. Por mais competitivo e selvagem que seja o ambiente onde seu negócio está inserido, você deve fabricar seu produto da melhor forma que lhe é possível sempre, mesmo sem saber a quem se destina. Assim, um fabricante de chinelos buscará fazê-los da melhor forma que possa satisfazer seus usuários, ainda que sejam completamente desconhecidos, podendo até ser um desafeto dele. É mais ou menos como, fazer o bem sem olhar a quem. Ou não?

Os recursos tecnológicos disponíveis pela revolução industrial e, mais recentemente, pela economia digital, nos fazem grandes produtores de excedentes a partir do nosso trabalho. Produzimos muito mais que somos capazes de consumir. Um simples liquidificador é utilizado apenas 5 minutos por dia para dar cabo de nossas necessidades, ficando o resto do tempo ocioso. O mesmo acontece com quem tem um sítio e um trator geralmente superdimensionado e, portanto, ocioso. Um pequeno forno é suficiente para produzir alimentos destinados a várias famílias. Que fazer com esses excedentes?

 Mais significativo ainda, é a nossa condição moderna resultante da economia do conhecimento, na qual a matéria-prima não se esgota com o uso. Pelo contrário, conhecimento não se divide – se multiplica. Passar conhecimento para outra pessoa não diminui este em nada, mas contrariamente, o amplia. Será o capital humano uma forma de capital absolutamente não degradável?

De forma pragmática, o que vemos nas relações comerciais é uma tendência crescente em direção a informalidade nas relações duradouras. À medida que convivemos com parceiros comerciais éticos, relaxamos naturalmente os nossos controles. Esse é o caminho espontâneo das transações econômicas: substituir valores materiais, as garantias e cauções, por exemplo, por valores humanos como a confiança e a solidariedade nas parcerias comerciais.

No início do século XX, Rudolf Steiner, pesquisador e filósofo austríaco, fundador da Antroposofia, desenvolveu um modelo de organização social que denominou de “Trimembração do Organismo Social”, no qual a atividade econômica, que é um dos 3 membros deste organismo, se inspirava na FRATERNIDADE. Tal modelo, implantado experimentalmente em uma pequena sociedade alemã foi logo desfeito em função de perseguições do dominante e crescente nazismo de então. Nesta proposta, a fraternidade é apresentada como sendo a origem arquetípica ou primitiva da atividade produtiva. De fato, a rigor nosso trabalho é realizado para os outros e pela necessidade dos outros – os nossos clientes, geralmente anônimos.   

Pode parecer difícil enxergar fraternidade no conturbado ambiente econômico, porém, me parece a cada dia mais evidente essa convergência. Os argumentos acima apresentados me fazem crer que Steiner estava certo na sua tese. Organizações que superaram esse paradigma tumultuado da visão de negócios através de parcerias, associativismo, cooperação ou práticas colaborativas nos negócios alcançaram patamares diferenciados no próprio fortalecimento e tornaram-se uma referência no que fazem. Acredito que a ganância, a cobiça, o consumismo e a indiferença aos valores humanos no meio dos negócios são apenas metamorfoses patológicas oriundas de uma leitura do mundo feita com a lente errada por um Ser Humano que também não se conhece e se ilude, mas que também é incapaz de alterar a verdade.


Publicado no jornal Cinform 26/10/2009 – Caderno Emprego


segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Lan house e educação em perfeita combinação

 

Na década de 90, as lan houses surgem como ambientes de jogos coletivos em computadores. Nessa época, os computadores eram bastante caros e as redes locais para conexão entre eles, ainda mais inacessíveis. Assim, as lan houses (lan significa Local Area Network e house significa casa) ou casas com redes locais de computadores, nesta primeira geração, adquirem o estigma de ambiente de jogos. Efetivamente, ainda hoje, algumas lan houses se configuram neste modelo ultrapassado. Uma segunda geração de lan houses surge a partir de 2000 ofertando além dos tradicionais jogos, o acesso à internet com maior velocidade que as linhas discadas domésticas e serviços de impressão, edição de imagens, digitação e gravação de CDs. Hoje, vivemos a 3ª geração de lan houses e cyber cafés que guarda diferenças importantes sobre as gerações anteriores e começa a organizar-se à medida que ganha consciência do destacado papel que cumpre na inclusão digital e social do Brasil.


No Brasil atual, as lan houses exercem um inestimável serviço às camadas mais pobres da população: de acordo com pesquisa encomendada pelo CGI/BR – Comitê Gestor da Internet no Brasil, 82% dos internautas brasileiros que ganham até 1 salário mínimo usam lan houses para acesso a grande rede. E mais, 68% dos internautas nordestinos também são usuários destes centros públicos de acesso pago. E uma boa notícia: 65% dos usuários de lan houses a procuram para fins de pesquisa acadêmica, 21% para fazer download de livros, 22% para buscar cursos e 10% para educação a distância. É ou não uma boa notícia? Pelo visto, ir contra a lan house é ir contra as classes menos privilegiadas.


A internet está influenciando decisivamente nosso cotidiano. Não fossem nossos preconceitos e hábitos (ou vícios) já estávamos muito mais envolvidos pelos serviços disponíveis nessa teia gigante. Por exemplo, que motivo há para enfrentarmos as infernais lojas de material escolar no início de cada ano, se podemos adquirir os mesmos livros confortavelmente através da internet em sites confiáveis. Desta forma, o comércio enfrenta novos desafios e precisa se renovar para entender este momento peculiar e dele tirar proveito ao invés de sentir-se ameaçado. Igualmente, muitos serviços públicos estão (alguns exclusivamente) disponíveis na internet, como a inscrição para o Enem, os concursos públicos, os pregões eletrônicos, o imposto de renda, o programa “Minha casa minha vida”, os editais, o Prouni, Boletins de Ocorrências (BO), emissão de Títulos de Eleitor, acompanhamento de processos judiciais, agendamento médico, matrícula escolar, emissão de certidões negativas, etc, etc e até divórcios. Em Salvador/BA, até autorização de obras, habite-se e outros serviços da prefeitura são solicitados via internet, exclusivamente através de lan houses credenciadas. Semelhantemente, em Manaus/AM as meia-passagens para estudantes são adquiridas em lan houses, livres de filas e gerando negócios para as pequenas empresas.


É interessante notar que a maior parte das dúvidas que temos no cotidiano também podem ser esclarecidas pela internet. Ou seja, se você quer aprender a dar nó em gravatas ou tirar mancha de ferrugem em tecidos, ou como produzir mudas de mangaba, a solução pode vir de algum site confiável sobre o tema. Também, pode-se usar a internet para manifestos políticos, participar de grupos de discussão ou redes sociais, e ainda usar os avançados serviços bancários disponíveis.


As lan houses podem ser lojas dos mais variados artigos sem estoque algum. Graças ao comércio eletrônico e à possibilidade de ser correspondente bancário, a lan house pode promover vendas interessantes até para quem não tem cartão de crédito ou conta bancária. Algumas já se especializaram em vender passagens aéreas ou terrestres, outras em vender anúncios classificados de jornais, e há também aquelas que vendem produtos de lojas locais facilitando a vida de milhares de pessoas. Afinal, é mais barato e rápido usar a lan house que pegar um ônibus.


Sergipe tornou-se referência nacional pelo seu pioneirismo em trabalhar a partir das lan houses. O principal projeto sergipano, oriundo do município de Estância, é orientado à educação. No referido projeto, as lan houses associadas e devidamente capacitadas, fizeram um convênio com a prefeitura para ofertar seus serviços aos estudantes da rede municipal e estadual de ensino que recebem o “webtíquete” dos seus professores. Para tanto, as lan houses estão preparadas para assistir ao estudante durante seu trabalho escolar. Caso, não ande na linha a casa é descredenciada perdendo os benefícios do convênio. Este projeto é motivo de orgulho para o estanciano, posto que já é objeto de estudo e desejo por duas capitais nordestinas e diversas outras cidades brasileiras atraindo a atenção de autoridades públicas e políticas dos mais diversos lugares.


Tudo que vimos aqui nos mostra a potencialidade da lan house no cenário atual. Tudo que a internet pode, a lan house pode. Como a maior parcela do povo brasileiro não tem qualquer intimidade com computadores e muito menos com a internet, isso exige mediação do gestor da lan house para que possam usufruir das coisas boas dessa moderna infovia.


As lan houses precisam superar o estigma negativo adquirido em outra época, assumindo uma posição mais responsável sobre o uso de seus computadores por menores, combatendo o anonimato absoluto, orientando novos usuários, não aceitando estudantes em horário de aulas. E esta nova postura já esta sendo adotada por muitas delas em todo o Brasil, seja através da adesão à rede CDI/LAN e ao seu código de conduta, seja pela legalização de sua atividade facilitada pelo novo código CNAE e nova Lei do Empreendedor Individual, ou ainda pelo associativismo exemplar de Estância e agora também em Aracaju com a fundação da primeira associação de lan houses da grande Aracaju.


Agora, se você é professor(a) e nada disso está acontecendo em sua região, faça como a professora baiana que levou seus alunos de 5ª e 6ª séries de uma escola pública a uma lan house para que pesquisassem sobre a cultura baiana e criassem um site sobre isso. Uma experiência pedagógica muito rica e significativa para todos. 




Publicado no jornal Cinform 12/10/2009 – Caderno Emprego