Vivemos uma
época contraditória: nunca produzimos tantos excedentes materiais e, ao mesmo
tempo, somos tão carentes de valores espirituais. Nesse ambiente
sócio-competitivo e materialista, pequenos gestos nobres nos comovem a ponto de
se tornarem sedutores ou fetiches.
Recentemente,
assistimos a Copa do Mundo acontecida em nosso Brasil. Muito além do futebol,
aliás, nativo da nossa alma, vimos outros gestos fenomenais. Simples e brilhante
exemplo veio dos torcedores japoneses ao limpar, após os jogos, o espaço do
estádio que ocuparam. Uma atitude que nos faz pensar tratar-se de uma torcida
que fez uma campanha superior à do valente time oriental. Dificilmente, o time
e seu futebol seria assunto para artigos jornalísticos pós-Copa, senão pela
geração de valor do comportamento da educada torcida.
Igualmente
superior, foi a performance extra-gramado da seleção alemã. A nobreza de
comportamentos e atitudes do time germânico conquistou o Brasil. O massacre em
campo contra nosso time, por 7x1, foi serenamente dissipado pelas demonstrações
cavalheiras e respeitosas, dirigidas a nosso povo e símbolos. Venceram com
mestria e dignidade.
Fosse uma
empresa comercial, o time alemão seria vitorioso também. Aliás, o termo empresa
se aplica corretamente a toda cruzada ou campanha que se realiza, conforme
ensina o Dicionário Houaiss: “obra ou desígnio levada a efeito por uma ou mais
pessoas; trabalho, tarefa para a realização de um objetivo; empreendimento. Ex.:
as navegações portuguesas constituem e. notáveis”.
Com efeito,
é com esse sentido de empresa que observamos o time campeão da Copa 2014, tirando
algumas lições para nossos negócios: Valorizar a equipe como um todo pelo
desempenho, ao invés de supervalorizar algumas estrelas; respeitar os
adversários e, assim, valorizar mais a própria vitória; ser humilde e não
tripudiar é reconhecer a transitoriedade dos fatos, já que ninguém será
eternamente o melhor; como demonstrou a deslizada “dança do gaúcho”, em Berlim.
Contudo, não seremos repetitivos nesse momento em que a mídia já disse tudo
isso, inclusive da marca de gratidão e humildade que os vencedores registraram nos
corações verde-amarelos.
A humildade
é o contrário da arrogância. Por isso, os sábios e todos que têm sede de
aprender são humildes. É típico do esnobe, pressupor que já sabe tudo, perdendo
a chance de aprender mais e, assim, se desqualificando lentamente. “Tudo” é um
nível impossível para a Educação e para a qualidade de nossos gestos, pois a
potencialidade humana é ilimitada e elástica, esticando sempre quando dela
necessitamos.
Ser humilde
é ser humano. É ser fértil para o crédito alheio. Não por acaso, as palavras:
humilde, humanidade e solo fértil derivam da mesma raiz latina “humus”. Simples: “do pó viemos e ao pó
voltaremos”, faz a grande convergência. Então, ser humilde é atingir uma esfera
humana tão primordial que desarma os argumentos mais bem elaborados nos
conflitos e competições da vida, mesmo correndo o risco de ser mal interpretado
em um meio social consumista e predador, porém dotado de posturas
insustentáveis em prazos maiores.
Exemplo
corajoso de humildade aconteceu em 1970, quando o chanceler alemão Willy
Brandt, viajou à Polônia, para comparecer a uma cerimônia em memória das
vítimas do Gueto de Varsóvia. Foi, certamente, um grande desafio fazer essa
aproximação em meio a uma ferida tão recente. Mesmo tendo preparado o difícil e
bem elaborado discurso, na hora da cerimônia, Brandt não conseguia achar as
palavras certas; e, em silêncio total, ajoelhou-se e abaixou a cabeça, num
profundo gesto de penitência que abriu os caminhos para a dolorosa
reconciliação. Naturalmente, esse gesto gerou polêmica, mas valeu mais que mil
discursos racionais, pois tocou diretamente nos indefesos corações de todos.
Por fim, que os bons e verdadeiros exemplos sejam vistos como
instrumentos de novas relações humanas. Assim, nos inspira mais um nobre
cavalheiro alemão, J. W. Goethe, inspirador da Pedagogia Waldorf: “Tudo quanto
se destina a surtir efeito nos corações, do coração deve sair”.
Publicado no Jornal Cinform em 21/07/2014 - Caderno Emprego
Publicado na revista
TI&N nº 19, de ago/2014